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Por que o Dia da Consciência Negra deve gerar reflexão – 20/11/2024 – Tom Farias

Data simbólica a de hoje, dia 20 de novembro, aliás, primeiro feriado nacional em homenagem à memória do herói quilombola Zumbi dos Palmares, morto na Serra da Barriga, em 1695.

Esse simbolismo pode ser visto de duas formas. No Brasil, enquanto ontem o presidente americano Joe Biden tirava fotos no Aterro do Flamengo, ao lado de outros chefes de Estado, incluindo o Lula, nos Estados Unidos, uma mulher negra, Kamala Harris, governava o país como presidente interina da nação mais poderosa do mundo.

A realidade experimentada por Kamala Harris está longe de ocorrer no Brasil. As razões para se afirmar isso estão impressas em letras de forma na cara de cada um dos brasileiros não negros.

O Brasil é supremacistamente racista, misógino e sexista ao extremo para admitir à ascensão de uma mulher negra ao poder. No passado, no início do período republicano, pelo menos três homens negros comandaram o país —Rodrigues Alves, Nilo Peçanha e Campos Sales.

De longe, isto é impensável agora —ao menos nos próximos horizontes. A ascensão dos negros brasileiros, embora sejamos numericamente a maioria da população, está no campo da quimera, do sonho, da impossibilidade absoluta. Por isso este país não pode ser considerado uma nação plena de direitos.

E há vivos interesses para isso, e, fica dito, escusos e inconfessáveis. Notícias correm soltas por aí dando conta de ataques racistas e violência contar gêneros. E acontecem —como amparar água na peneira— fora de qualquer controle.

Se nos Estados Unidos uma mulher afro-americana, goza do direito de comandar país tão poderoso, enquanto Biden gira pelo Brasil tirando fotos e distribuindo sorrisos, tendo ao fundo a bela baía de Guanabara, por aqui 55,5% da população, que é negra, continua em luta permanente por igualdade de condições e por uma melhor perspectiva de acesso ao poder.

É muito bizarro. Nosso país deve ser o único no mundo em que uma maioria negra —a maior medição desde o Censo Demográfico de 1872, realizado ainda no Império— se deixa comandar por uma minoria branca.

Pescando a deixa da passagem do G20, podemos evocar a frase muito própria de Charles De Gaulle, falando da França, que presidiu, que se aplica bem ao nosso sistema: “Nós não temos amigos, nós temos interesses.”

Os negros brasileiros não têm amigos; tem gente interessada, e não negra, em alguma coisa a respeito deles. Se não fosse assim, após 136 anos da abolição, algo novo já teria ocorrido por aqui positivamente, entre negros e brancos.

No entanto, o simbolismo representado por Kamala Harris e pela Serra da Barriga, onde assassinaram Zumbi dos Palmares, tem similaridades forte demais para todos nós, negros e negras, mundo afora.

No caso dos Estados Unidos, ao que tudo indica, parece ser a primeira e última vez que a população afro-americana se verá representada no poder maior. No Brasil, só um outro mártir como Zumbi, com os punhos lançados no ar, para ameaçar o status quo hegemônico do poder branco e “forçar”, por maioria absoluta, uma paridade no comando deste país, país tão latino —e ladino—, por este ponto de vista.

Avante! Precisamos de uma nação para todos, além e acima do feriado do negro Zumbi.


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