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um material íntimo revestido de magnífico classicismo

Bennie Loewy (Seth Rogen), Burt Fabelman (Paul Dano) e Mitzi Fabelman (Michelle Williams), em «The Fabelmans», de Steven Spielberg.

FRANÇA 2 – DOMINGO 5 DE JANEIRO ÀS 21h10 – FILME

Enquanto Hollywood se transforma visivelmente, completando a sua transformação digital, vários cineastas americanos sentiram a necessidade de olhar para o passado: Quentin Tarantino, com Era uma vez… em Hollywood (2019), Paul Thomas Anderson, com Pizza de alcaçuz (2021), James Gray, com Hora do Armagedom (2022)… Um pouco mais que uma moda passageira: uma verdadeira veia que pode ser vista, alternativamente, como um canto de cisne ou um retorno ao básico.

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Agora é a vez de Steven Spielberg, 78 anos, adicionar um novo capítulo. A descendência de New Hollywood e artista triunfante dos anos 1980 a 2000 dedica-se aqui, pela primeira vez, à autobiografia, numa terna evocação da sua infância, do seu despertar artístico e, sobretudo, dos seus pais.

Pela primeira vez pessoal, Spielberg? Não, e é precisamente isso que prova Os Fabelmans (2022), pois a sucessão de cenas primitivas que ele refaz remete aos motivos e figuras mais conhecidos de sua obra: pais fantasmas (Sempre1989) e mães caprichosas (Me pegue se puder2002), espectro do divórcio (ET1982), as iluminações da imaginação (Encontros do Terceiro Grau1977) ou a casa como santuário inevitavelmente condenado à desintegração.

Michelle Williams com uma precisão deslumbrante

A história começa numa noite de inverno de 1952, em frente a um cinema onde um casal leva o filho para ver seu primeiro filme, Sob a maior marquise do mundode Cecil B. DeMille. Aterrorizado pela cena do acidente de trem, o garoto contrairá o vírus do cinema, pelo ângulo do medo e da catástrofe. Ele nunca deixará de mexer em seus próprios filmes, pequenas tiras inventadas em super-8 com suas duas irmãs ou entre amigos, westerns ou filmes de guerra amadores onde algo dessa briga inicial pode ser conjurado.

Nesta procura de pais substitutos em que a cinefilia há muito se constitui, Spielberg opta, ao contrário, por afirmar o contributo decisivo da sua mãe, interpretada por uma Michelle Williams de uma precisão deslumbrante. Esta mãe em relevo, a sua fibra poética, a sua fenda secreta, a sua presença transbordante, prisioneira do quotidiano, está inteiramente do lado da ficção. Veja esta passagem graciosa e surpreendente onde, durante um acampamento, ela começa a dançar em sua camisola diante dos faróis de um carro, seminua para todos verem – beleza e escorregadio se misturam no mesmo movimento.

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Este material íntimo, Spielberg envolve-o calorosamente nos termos de um classicismo magnífico, através da sua redondeza de linhas, da sua fluidez de expressão, do seu sentido de detalhe saliente e da sua sensibilidade tragicómica. Com seu roteirista, Tony Kushner (Munique2005), o cineasta faz a aposta romântica de longa data.

O romance de formação de seu jovem herói e alter ego Sammy (Mateo Zoryon Francis-DeFord para a infância, Gabriel LaBelle para a adolescência) é apresentado através de extensas sequências que pontuam sua passagem para a idade adulta e param no limiar de seu ingresso na profissão. Para finalizar, Sammy encontra um monumento: John Ford (a quem outro cineasta, David Lynch, empresta seus longas). A carreira de Spielberg é relegada para fora das telas – estamos longe da cinebiografia e de sua lógica de “panteonização”.

Os Fabelmans : Filme americano de Steven Spielberg. Com Gabriel LaBelle, Michelle Williams, Paul Dano, Seth Rogen (2:31). França 2

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