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Apagão em São Paulo: poda é mal feita, diz botânico – 16/10/2024 – Cotidiano

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Letícia Mori e Luiz Fernando Toledo

Cindo dias depois da queda inicial de energia que deixou 2,6 milhões de imóveis sem luz na região metropolitana de São Paulo, cerca de 100 mil imóveis continuavam sem eletricidade, segundo balanço divulgado pela concessionária Enel, responsável pela distribuição na região.

O ministro das Minas e Energia, Alexandre Silveira, afirmou na segunda (14), que “50% do apagão foi causado pela queda de árvores”.

A Enel também costuma culpar as árvores. A empresa já havia sido multada neste ano pela Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) em R$ 165,8 milhões em fevereiro de 2024 por causa de outro apagão, em novembro de 2023.

O valor, no entanto, não foi pago, porque a empresa contesta a multa na Justiça. No processo, a Enel afirma que não podia prever os danos às redes no início do ano, causados por “ventos e chuvas muito acima do previsto” que levaram a danos à rede “especialmente causados pela queda de árvores”.

Dados da Prefeitura de São Paulo mostram que pedidos de poda ou remoção de árvores foram a 5ª maior causa de reclamação feita à prefeitura pelo 156 no primeiro semestre de 2024 —e que essas foram as queixas com um dos menores índices de resolução.

Cerca de 37% das reclamações sobre árvores do 1º semestre ainda estão marcadas como não resolvidas no sistema.

A obrigação do manejo das árvores é da prefeitura, mas a Enel tem a obrigação contratual de fazer a manutenção das árvores que afetem diretamente o sistema de energia, ou seja, das árvores estão muito próximas dos fios.

Quando uma árvore cai, a prefeitura não pode fazer a remoção se a Enel não participar fazendo o desligamento dos fios no local.

A Prefeitura afirma que cerca de 6.000 reclamações não puderam ser atendidas porque precisam de intervenção da Enel e a empresa não fez os atendimentos. A empresa executou apenas 1% das podas de árvore em contato com a fiação no primeiro semestre de 2024.

A Enel não respondeu aos questionamentos feitos pela BBC News Brasil sobre o assunto.

A responsabilização das árvores por apagões é recorrente.

Em novembro do ano passado, o governador do Estado, Tarcísio de Freitas, também havia culpado as árvores pela falta de luz em uma situação parecida. “O grande vilão desse episódio foi a questão arbórea”, disse ele à época.

No entanto, não há uma correlação entre o número de queda de árvores e a quantidade de pessoas que ficam sem luz.

Ao todo 386 árvores caíram na última sexta-feira, quando se iniciou o apagão, segundo a prefeitura. Em 3 de novembro de 2023, menos imóveis ficaram sem energia (cerca de 2,1 milhões) sendo que o número de queda da árvores foi quatro vezes maior (foram 1.500 árvores caídas).

O botânico Ricardo Cardim afirma que as árvores não são as vilãs da falta de energia e que diminuir a arborização da cidade pode agravar ainda mais o problema.

Se receberem um mínimo de cuidado e tiverem a poda feita de maneira adequada, diz ele, as árvores não terão o risco de cair e afetar o sistema elétrico.

“O problema é a falta de manutenção, de cuidado. As árvores caem de doentes, de sofridas, independentemente de evento climático”, afirma Cardim, que é autor do livro “Remanescentes da Mata Atlântica: As Grandes Árvores da Floresta Original e Seus Vestígios”.

Por outro lado, diz ele, podá-las sem os cuidados necessários e não fazer a substituição das que precisam ser removidas por outras árvores pode piorar muito problemas ambientais como ilhas de calor e tempestades intensas.

Estudo do pesquisador Giuliano Locosseli, pós doutor em epidemiologia ambiental, mostra que as árvores em São Paulo são tão vulneráveis à chuva e ao vento por causa da falta de cuidados e de sua saúde precária.

A pesquisa mostra que, embora a queda de árvores seja maior durante a estação chuvosa, também há muita queda de árvores durante a estação seca por conta a falta de manutenção. “Árvores mal cuidadas caem nas ruas diariamente sem nenhuma causa climática aparente”, diz o estudo.

Ou seja, o problema não é causado por “eventos climáticos imprevistos”, diz Cardim, mas pela falta de manutenção.

E a queda de árvores é totalmente evitável, segundo pesquisadores.

Singapura, por exemplo, tem cerca de 2 milhões de árvores urbanas (três vezes mais do que São Paulo) e não tem problemas com a queda. As árvores são substituídas antes de cair, as mais velhas recebem atenção especial e todas têm sua saúde monitorada por equipes com ajuda de câmeras e um sistema de IA.

Em São Paulo, no entanto, não existe o mesmo tipo de monitoramento nem a frequência adequada na manutenção, afirma Cardim.

Questionada pela BBC News Brasil, a Prefeitura de São Paulo afirmou que o tempo de espera médio para atendimento dos pedidos de poda ou remoções de árvores teve uma diminuição de 80% entre 2017 e 2024 e que podou 132 mil árvores até 10 de outubro deste ano.

Já o governo do Estado não voltou a culpar as árvores neste ano. A administração estadual afirmou que o governador e os prefeitos de cidades afetadas entregaram nesta terça (15) uma carta ao ministro do TCU (Tribunal de Contas da União), Augusto Nardes, solicitando que o órgão tome “as medidas cabíveis para que órgãos federais competentes declarem, com urgência, a intervenção” na Enel ou o cancelamento do contrato de concessão devido às falhas.

O governo federal, através de diversas instâncias, prometeu cobrar a Enel e a Prefeitura de São Paulo pelos problemas. Mas o Ministério das Minas e Energia não respondeu ao pedido de esclarecimento feito pela BBC News Brasil.

A Enel também não respondeu aos questionamentos feitos pela reportagem.

Menos árvores, mais problemas

Tratar as árvores como “vilãs” e simplesmente retirá-las em vez de fazer uma melhor manutenção pode agravar os problemas enfrentados pela cidade —inclusive a intensidade das chuvas e temporais, afirma Cardim.

As árvores contribuem para uma melhora no clima da cidade, explica ele, e com uma série de benefícios conhecidos há muito tempo pela ciência.

Elas promovem um aumento da vida útil do asfalto por causa do sombreamento, filtram os poluentes no ar, absorvem o CO², interceptam a água da chuva e a radiação do sol, diminuem o risco de enchentes e diminuem as chamadas ilhas de calor.

Ilhas de calor são um fenômeno que acontece em ambientes muito urbanizados onde a falta de vegetação e a alta concentração de edifícios e de concreto faz com que certas áreas fiquem com temperaturas muito mais altas do que a região ao redor.

“Infelizmente, por falta de educação ambiental, o brasileiro ainda não compreendeu que as árvores não são apenas algo estético”, afirma Cardim. “Elas têm muitas funções no ambiente urbano.”

As ilhas de calor que aumentam com diminuição da arborização agravam a intensidade de chuvas, ventos e temporais, afirma Cardim.

“Sem as árvores, as ilhas de calor potencializam as tempestades drásticas, a água cai toda de uma vez só”, explica o botânico.

Ou seja, com a diminuição da arborização sem substituição da vegetação, os eventos climáticos intensos —que têm se tornado mais comuns em geral por causa do aquecimento global— podem ficar ainda piores, argumenta Cardim.

Hoje, as áreas urbanizadas do município que mais sofrem com ilhas de calor e outros problemas gerados pela falta de arborização são as regiões mais pobres da cidade, afirma o botânico.

Enquanto um bairro nobre como Alto de Pinheiros tem uma cobertura vegetal de 41%, bairros pobres como Arthur Alvim e Brás têm uma cobertura vegetal de 12% e 5%, segundo dados do Mapa da Desigualdade.

Em 2017, Alto de Pinheiros tinha 13 mil árvores plantadas nas vias, enquanto São Miguel tinha cerca de 4.000, segundo os últimos dados da Secretaria do Meio Ambiente disponíveis.

‘Poda mutiladora’

A poda mal feita é um dos principais fatores que adoecem as árvores em São Paulo, afirma Ricardo Cardim. Podas drásticas desequilibram a copa da árvore e a deixam vulneráveis a doenças e insetos predadores.

Cardim explica que a poda das árvores é muito necessária e precisa ser feita com maior periodicidade e maior cuidado técnico, da forma e na época correta, respeitando a idade do galho.

“A prefeitura poda pouco, com pouca periodicidade, aí tem que podar os galhos já muito crescidos, grandes”, diz Cardim. “Da forma como é feita pela prefeitura, a poda é mutiladora. Ela deixa feridas que não cicatrizam fácil, abre espaço para a entrada de cupins e doenças. A árvore adoece e depois de uns anos pode cair.”

A prefeitura afirma em seu site que os serviços só são realizados com avaliação técnica prévia.

“Recebida a solicitação, um engenheiro agrônomo da Subprefeitura vai até o local onde se encontra a árvore para realizar uma avaliação técnica e a emissão de laudo para poda ou remoção, dependendo do estado da árvore.”

Outro fator é a pavimentação e compactação do solo ao redor das raízes das árvores, o que afeta sua capacidade de absorver nutrientes e a estabilidade da planta, porque as raízes não têm espaço para crescer.

As árvores também passam sede, porque a absorção de água acontece através da raiz. Quando o canteiro é concretado, não há infiltração de água e o solo fica seco mesmo que haja chuva.

Muitas árvores também têm suas raízes cortadas e danificadas em obras na calçadas ou crescem tortas por falta de escoras.

“A criação de equipes com capacidade técnica para fazer a poda e o manejo correto não é uma coisa mirabolante”, defende Cardim. “É, inclusive, milhares de vezes mais barato e muito mais plausível do que o enterramento dos fios, que custaria bilhões, que é inviável.”

Remoção feita da forma correta

Árvores que já têm risco de queda, afirma Cardim, precisam sim serem removidas, mas isso também precisa ser feito com mais cuidado e pensando no futuro.

Segundo ele, a prefeitura tem feito a substituição das árvores com risco por árvores muito jovens ou por árvores anãs, que nunca vão crescer até o tamanho das anteriores e por isso não vão trazer os mesmos benefícios.

“Isso quando não simplesmente cimentam a terra depois de tirar a árvores, como se nunca tivesse tido nada ali”, afirma ele.

“A Prefeitura de São Paulo sequer sabe quantas árvores existem na cidade e qual o seu estado de saúde”, diz.

O último levantamento feito pela Secretaria do Meio Ambiente sobre árvores é de 2017 e levava em consideração somente as árvores no sistema viário, ou seja, as árvores próximas às ruas e avenidas.

Eram 650 mil —não há informações sobre quantas delas estão doentes, quantas caíram ou foram substituídas desde então.

Questionada pela BBC News Brasil, a Prefeitura de São Paulo afirmou que “o reforço da Prefeitura de São Paulo no trabalho de poda de árvore em toda a cidade minimizou os impactos da tempestade ocorrida na última sexta-feira”.

Segundo a prefeitura, as ocorrências de queda de árvores na sexta foram 386, em comparação com 1.500 em um episódio em novembro do ano passado, quando as chuvas e o vento foram menos intensos.

A prefeitura afirmou que o tempo de espera médio para atendimento dos pedidos de poda ou remoção de árvores feito por cidadãos caiu de 507 dias em 2017 para 54 em 2024, uma diminuição de 80%.

A administração municipal disse ainda que “realizou a poda de 132.809 árvores em toda a cidade de janeiro a 10 de outubro deste ano, uma média de 465 árvores por dia”.

A Prefeitura, no entanto, não respondeu sobre o que tem feito para cuidar da saúde das árvores, sobre a crítica de que podas ruins têm deixado as árvores vulneráveis a fungos e doenças, sobre a substituição de plantas doentes ou sobre planos para ampliar a arborização na cidade.

Também não explicou se faz podas preventivas com base em uma avaliação própria ou se somente faz as podas atendendo a chamados dos moradores. E não deu uma explicação para o fato de não haver dados oficiais atualizados em relação à quantidade e saúde das árvores na cidade.

A Enel não respondeu aos questionamentos feitos pela BBC News Brasil até a publicação desta reportagem.



Leia Mais: Folha

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PPG em Educação da Ufac promove 4º Simpósio de Pesquisa — Universidade Federal do Acre

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PPG em Educação da Ufac promove 4º Simpósio de Pesquisa — Universidade Federal do Acre

A Ufac realizou, nessa terça-feira, 18, no teatro E-Amazônia, campus-sede, a abertura do 4º Simpósio de Pesquisa do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE). Com o tema “A Produção do Conhecimento, a Formação Docente e o Compromisso Social”, o evento marca os dez anos do programa e reúne estudantes, professores e pesquisadores da comunidade acadêmica. A programação terminou nesta quarta-feira, 19, com debates, mesas-redondas e apresentação de estudos que abordam os desafios e avanços da pesquisa em educação no Estado.

Representando a Reitoria, a pró-reitora de Pós-Graduação, Margarida Lima Carvalho, destacou o papel coletivo na consolidação do programa. “Não se faz um programa de pós-graduação somente com a coordenação, mas com uma equipe inteira comprometida e formada por professores dedicados.”

O coordenador do PPGE, Nádson Araújo dos Santos, reforçou a relevância histórica do momento. “Uma década pode parecer pouco diante dos longos caminhos da ciência, mas nós sabemos que dez anos em educação carregam o peso de muitas lutas, muitas conquistas e muitos sonhos coletivos.”

 

A aluna do programa, Nicoly de Lima Quintela, também ressaltou o significado acadêmico da programação e a importância do evento para a formação crítica e investigativa dos estudantes. “O simpósio não é simplesmente dois dias de palestra, mas dois dias de produção de conhecimento.” 

A palestra de abertura foi conduzida por Mariam Fabia Alves, presidente da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Anped), que discutiu os rumos da pesquisa educacional no Brasil e os desafios contemporâneos enfrentados pela área. O evento contou ainda com um espaço de homenagens, incluindo a exibição de vídeos e a entrega de placas a professores e colaboradores que contribuíram para o fortalecimento do PPGE ao longo desses dez anos.

Também participaram da solenidade o diretor do Cela, Selmo Azevedo Apontes; a presidente estadual da Associação de Política e Administração da Educação; e a coordenadora estadual da Anfope, Francisca do Nascimento Pereira Filha.

(Camila Barbosa, estagiária Ascom/Ufac)

 



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Consu da Ufac adia votação para 24/11 devido ao ponto facultativo — Universidade Federal do Acre

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A votação do Conselho Universitário (Consu) da Ufac, prevista para sexta-feira, 21, foi adiada para a próxima segunda-feira, 24. O adiamento ocorre em razão do ponto facultativo decretado pela Reitoria para esta sexta-feira, 21, após o feriado do Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra.

A votação será realizada na segunda-feira, 24, a partir das 9h, por meio do sistema eletrônico do Órgão dos Colegiados Superiores. Os conselheiros deverão acessar o sistema com sua matrícula e senha institucional, selecionar a pauta em votação e registrar seu voto conforme as orientações enviadas previamente por e-mail institucional. Em caso de dúvidas, o suporte da Secrecs estará disponível antes e durante o período de votação.

 



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Professora Aline Nicolli, da Ufac, é eleita presidente da Abrapec — Universidade Federal do Acre

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Professora Aline Nicolli, da Ufac, é eleita presidente da Abrapec — Universidade Federal do Acre

A professora Aline Andréia Nicolli, do Centro de Educação, Letras e Artes (Cela) da Ufac, foi eleita presidente da Associação Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências (Abrapec), para o biênio 2025-2027, tornando-se a primeira representante da região Norte a assumir a presidência da entidade.

Segundo ela, sua eleição simboliza não apenas o reconhecimento de sua trajetória acadêmica (recentemente promovida ao cargo de professora titular), mas também a valorização da pesquisa produzida no Norte do país. Além disso, Aline considera que sua escolha resulta de sua ampla participação em redes de pesquisa, da produção científica qualificada e do engajamento em discussões sobre formação de professores, práticas pedagógicas e políticas públicas para o ensino de ciências.

“Essa eleição também reflete o prestígio crescente das pesquisas desenvolvidas na região Norte, reforçando a mensagem de que é possível produzir ciência rigorosa, inovadora e socialmente comprometida, mesmo diante das dificuldades operacionais e logísticas que marcam a realidade amazônica”, opinou a professora.

Aline explicou que, à frente da Abrapec, deverá conduzir iniciativas que ampliem a interlocução da associação com universidades, escolas e entidades científicas, fortalecendo a pesquisa em educação em ciências e contribuindo para a consolidação de espaços acadêmicos mais diversos, plurais e conectados aos desafios educacionais do país.

 



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