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Negócios caseiros: os suspeitos contratos do governo Lula com ‘organismos internacionais’

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Negócios caseiros: os suspeitos contratos do governo Lula com ‘organismos internacionais’

Hugo César Marques

Em março do ano passado, o presidente Lula assinou um decreto autorizando “organismos internacionais” a participar da preparação de três grandes eventos que o Brasil vai sediar: a Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP30), em Belém, o fórum do Grupo dos Vinte (G20), no Rio de Janeiro, e o encontro de cúpula do Brics, também no Rio. O mesmo decreto aumentou de 5% para 10% a taxa de administração que as entidades podem receber pelo serviço e ainda permitiu que elas terceirizem algumas tarefas. Esse arcabouço teria o objetivo de driblar a burocracia, economizar tempo e reduzir custos. As boas intenções, no entanto, têm apontado numa certa direção. Como não há necessidade de licitação, cabe ao governo escolher as entidades capacitadas para realizar o trabalho — e, ao que parece, elas vêm sendo selecionadas de acordo com critérios bastante objetivos.

PARCERIA - Barchini e Janja: TCU investiga contrato de 478 milhõesClaudio Kbene/PR

O Ministério do Meio Ambiente, por exemplo, contratou recentemente a Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso) para organizar a 5ª Conferência Nacional do Meio Ambiente, uma reunião preparatória para a COP30. Apesar do nome pomposo, pouco se sabe sobre essa “organização internacional” que recebeu 15 milhões de reais para promover um encontro que será realizado em Brasília na próxima semana. O site da entidade informa que ela desenvolve atividades de “docência de pós-graduação e outras modalidades de cooperação no campo do desenvolvimento econômico e social e da integração da América Latina e do Caribe”. Parece realmente algo importante, embora amplo demais. Quem responde pela Flacso em Brasília é Rita Gomes do Nascimento, conhecida como Rita Potyguara, uma militante de causas indígenas, professora lotada na Secretaria de Educação do Ceará e próxima ao ministro da Educação, Camilo Santana. Nas redes sociais de Potyguara, são muitas as postagens simpáticas a Lula e ao governo.

A sede da Flacso funciona numa pequena sala no 1º andar da Escola Nacional de Administração Pública (Enap), o que é estranho. A Enap é uma repartição pública ligada ao Ministério da Gestão. Tem-se, portanto, uma entidade privada que presta serviços ao governo e funciona dentro de uma instalação do governo como se fosse um órgão de governo. VEJA esteve duas vezes no local. Na primeira, não havia qualquer referência de que lá funcionava um “organismo internacional”. Depois da visita da reportagem, um adesivo foi fixado na porta com o nome da entidade. “A manutenção da sede administrativa da Flacso Brasil nas dependências da Enap se fundamenta na proposição de que ambas as partes reconhecem os mútuos benefícios da conjugação de esforços para a promoção do ensino e pesquisa”, informou, por meio de nota, a direção da escola. A Flacso foi autorizada a ocupar o espaço em 2015, durante o governo da então presidente Dilma Rousseff.

DOIS LADOS - Potyguara: representante da Flacso e conselheira no MEC
DOIS LADOS - Potyguara: representante da Flacso e conselheira no MEC//Divulgação
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Em fevereiro passado, Rita Potyguara foi nomeada por Camilo Santana para ocupar uma vaga no Conselho Superior da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), órgão do Ministério da Educação que define, entre outras coisas, a concessão de bolsas de estudo no exterior. Assim, a professora ocupa um cargo no governo e, ao mesmo tempo, comanda uma entidade que presta serviços em caráter privado ao próprio governo. É o que em Brasília se costuma chamar de comportamento anfíbio. O Ministério do Meio Ambiente informou que a contratação da Flacso atendeu aos requisitos estabelecidos no decreto assinado pelo presidente Lula. “O critério fundamental é a comprovação de expertise na matéria, o que é o caso da mencionada fundação, conforme a lista oficial da Agência Brasileira de Cooperação”, justificou. Nos últimos seis anos, a entidade recebeu 4,8 milhões de reais dos cofres públicos a título de “contribuição regular”. A última delas, de meio milhão de reais, ocorreu em abril do ano passado. Procurada por VEJA, nem a Flacso nem sua representante quiseram se manifestar.

Brasília (DF), 21/03/2025 - A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, durante lançamento de edital de seleção de projetos de restauração ecológica na Amazônia, a iniciativa ¿Restaura Amazônia¿. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
SEM LICITAÇÃO – Marina: “O critério fundamental é a comprovação de expertise na matéria”Marcelo Camargo/Agência Brasil

Por ser uma “organização internacional”, a Flacso não está sujeita à fiscalização de órgãos como o Tribunal de Contas da União. É uma blindagem que poupa essas entidades de dar maiores explicações sobre detalhes que podem ser espinhosos. No início de abril, deputados encaminharam ao TCU um pedido para que a Corte investigue a relação da primeira-dama Janja com a Organização dos Estados Ibero-Americanos para a Educação, Ciência e Cultura. A OEI foi contratada por 478 milhões de reais para organizar a COP30. Janja é uma das coordenadoras da OEI. Mas não é apenas isso que chama atenção. Dias após a assinatura do decreto presidencial, Lula teve uma reunião com Leonardo Barchini, então diretor da OEI. Depois disso, ele foi nomeado secretário-executivo do Ministério da Educação. Na sequência, a entidade formalizou a parceria milionária com o governo. Procurado, o agora ex-diretor da OEI esclareceu que Janja atua na entidade desde 2023 e que ele ainda não havia tomado posse no cargo público quando o contrato foi assinado — portanto, não haveria qualquer conflito de interesses. Um detalhe curioso: na condição de secretário-executivo do MEC, foi Barchini quem empossou Rita Potyguara como conselheira no ministério. São simples coincidências, claro.

Publicado em VEJA de 2 de maio de 2025, edição nº 2942

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Matheus Leitão

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“Estou muito envergonhado! Isto é uma indignidade inexplicável!” (Ciro Gomes, ex-ministro da Fazenda, usando as redes sociais para reclamar da troca de Carlos Lupi por Wolney Queiroz, seu desafeto no PDT, no comando do Ministério da Previdência Social) 


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Felipe Barbosa

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A articulação para mudar quem define o teto de jur…

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A articulação para mudar quem define o teto de jur...

Nicholas Shores

O Ministério da Fazenda e os principais bancos do país trabalham em uma articulação para transferir a definição do teto de juros das linhas de consignado para o Conselho Monetário Nacional (CMN). 

A ideia é que o poder de decisão sobre o custo desse tipo de crédito fique com um órgão vocacionado para a análise da conjuntura econômica. 

Compõem o CMN os titulares dos ministérios da Fazenda e do Planejamento e Orçamento e da presidência do Banco Central – que, atualmente, são Fernando Haddad, Simone Tebet e Gabriel Galípolo.

A oportunidade enxergada pelos defensores da mudança é a MP 1.292 de 2025, do chamado consignado CLT. O Congresso deve instalar a comissão mista que vai analisar a proposta na próxima quarta-feira. 

Uma possibilidade seria aprovar uma emenda ao texto para transferir a função ao CMN.

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Hoje, o poder de definir o teto de juros das diferentes linhas de empréstimo consignado está espalhado por alguns ministérios. 

Cabe ao Conselho Nacional da Previdência Social (CNPS), presidido pelo ministro da Previdência Social, Wolney Queiroz, fixar o juro máximo cobrado no consignado para pensionistas e aposentados do INSS.

A ministra da Gestão e Inovação, Esther Dweck, é quem decide o teto para os empréstimos consignados contraídos por servidores públicos federais.

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Na modalidade do consignado para beneficiários do BPC-Loas, a decisão cabe ao ministro do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Wellington Dias.

Já no consignado de adiantamento do saque-aniversário do FGTS, é o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, que tem a palavra final sobre o juro máximo.

Atualmente, o teto de juros no consignado para aposentados do INSS é de 1,85% ao mês. No consignado de servidores públicos federais, o limite está fixado em 1,80% ao mês.

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Segundo os defensores da transferência da decisão para o CMN, o teto “achatado” de juros faz com que, a partir de uma modelagem de risco de crédito, os bancos priorizem conceder empréstimos nessas linhas para quem ganha mais e tem menos idade – restringindo o acesso a crédito para uma parcela considerável do público-alvo desses consignados.

Ainda de acordo com essa lógica, com os contratos de juros futuros de dois anos beirando os 15% e a regra do Banco Central que proíbe que qualquer empréstimo consignado tenha rentabilidade negativa, a tendência é que o universo de tomadores elegíveis para os quais os bancos estejam dispostos a emprestar fique cada vez menor.



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