Demis Hassabis e John M. Jumper (Google DeepMind, UK), e mais David Baker (Universidade de Washington, EUA), receberam o Nobel de química desse ano por suas contribuições para dois problemas que aguardavam uma solução havia 50 anos: a previsão tanto da estrutura 3D das proteínas, a partir de sua sequência de aminoácido, quanto de sequências de aminoácidos passíveis de formar essa estrutura.
Constituídas de aminoácidos, as proteínas são macromoléculas biológicas que desempenham funções essenciais à vida. A ordem pela qual os aminoácidos se combinam define a estrutura 3D, que, por sua vez, determina sua função biológica.
Determinar a estrutura de proteínas em laboratório é um processo longo e custoso. É aí que entram as abordagens teóricas e a inteligência artificial. O AlphaFold2, desenvolvido por Hassabis e Jumper, utilizou estruturas 3D de proteínas determinadas ao longo de 50 anos; técnicas sofisticadas de IA; conhecimento biológico evolutivo, bem como uma infraestrutura computacional que, com uma acurácia inédita, lhe possibilitou prever a estrutura 3D de proteínas a partir de sua sequência de aminoácidos.
Já David Baker trabalhou no problema inverso: o planejamento de proteínas. A partir de uma estrutura imaginária de proteína com uma dada função -por exemplo, uma enzima que catalisará uma reação química-, ele tenta prever a sequência de aminoácidos mais apropriada para formar essa estrutura. Modelos generativos de difusão, os mesmos usados para a geração de imagens, estão permitindo gerar proteínas com aplicabilidade em múltiplas áreas, como novas enzimas, biossensores e biofármacos.
E o que está por vir?
O AlphaFold2 possibilita que cientistas testem suas predições em sistemas específicos, identificando limitações –como na predição de estruturas de anticorpos– e propondo melhorias. Além disso, ele vem nos permitindo abraçar desafios mais complexos, como prever: 1) o efeito de mutações na estrutura de proteínas, crítico para entender doenças genéticas; 2) a estrutura entre proteínas e DNA, como as que formam os cromossomos; 3) o comportamento dinâmico das proteínas e sua interação com fármacos, impulsionando novas terapias.
No Brasil, temos cientistas competentes tanto na área computacional, desenvolvendo abordagens teóricas e IA para entendermos melhor as estruturas de proteínas; quanto experimental, gerando dados sobre novas proteínas, humanas e da biodiversidade, muitas das quais são hoje sub-representadas.
O trabalho de um retroalimenta o do outro, sendo crucial para o enriquecimento de bases de dados e o refinamento de modelos de IA. Um exemplo, inclusive usado no trabalho de Baker para validar seu modelo, é o da enzima OleTPRN, cuja estrutura experimental foi determinada no CNPEM.
Como pesquisadores do CNPEM, nós também nos dedicamos à aplicação da IA na interface da biologia com a química. Helder Ribeiro busca planejar computacionalmente novos receptores de células T, capazes de reconhecer antígenos específicos e redirecionar a ação das células T contra células tumorais ou infectadas por vírus. Daniela Trivella, por sua vez, emprega ferramentas experimentais e computacionais para mapear moléculas da biodiversidade (enzimas e pequenas moléculas), mirando no desenvolvimento de novos fármacos e biocatalisadores para sua produção.
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Daniela Trivella e Helder Ribeiro Filho são pesquisadores no Laboratório Nacional de Biociências do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (LNBio/CNPEM).
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