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Cidade brinca de cobrir rosto em folia no interior de PE – 03/03/2025 – Cotidiano

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Cidade brinca de cobrir rosto em folia no interior de PE - 03/03/2025 - Cotidiano

Roberto de Oliveira

Na festa da carne, mostrar o rosto é pecado. Ao contrário do que acontece nas festividades carnavalescas Brasil afora, em um município do agreste de Pernambuco a tradição prega pelo anonimato. As máscaras e as vestimentas brilhantes fazem dos papangus algo inédito no Brasil. Nessa brincadeira, quem tem a cara exibida é a mulher do padre.

Estamos em Bezerros, cidade com cerca de 62 mil habitantes localizada a pouco mais de 100 km da capital, Recife. Aqui é a terra dos papangus, personagens que surgiram no século 19 como um tipo de crítica de negros escravizados aos banquetes da elite, promovidos pelos senhores de engenho da cana-de-açúcar. A partir dos anos 1990, a manifestação passou a ganhar contornos de brincadeira, tornando-se símbolo do Carnaval.

Mesmo com um calor de sensação térmica na casa dos 40ºC, as ruas do centro da cidade ficam tomadas de gente, agraciada com muito brilho e, é claro, gente mascarada e fantasiada. Até o fim do Carnaval, cerca de 600 mil pessoas devem acompanhar os cortejos dos papangus.

O nome papangus, a propósito, vem de “papa-angu”. Foi assim que essas pessoas mascaradas passaram a ser chamadas ainda no século 19, quando, trajadas de fantasias rudimentares, saíam pelas ruas brincando. Batiam de porta em porta pedindo angu de milho, ou seja, de fubá, aos bezerrenses. As crianças trataram logo de colocar um apelido nessa turma: “Lá vem os papa-angu”.

Pronto! De “papa-angu” para papangus foi só um pulinho… de Carnaval.

“Na época da escravatura, os negros se fantasiavam, cobriam partes do corpo, sobretudo o rosto, como uma crítica a esses banquetes da elite. Se disfarçaram para não serem identificados e não sofrerem nenhum tipo de represália”, explica Eudes Mateus, 28, secretário de Turismo e Cultura do município.

“Sempre de forma bastante rústica, essas manifestações ocorreram em outros pontos do Nordeste. Aqui em Bezerros, contudo, elas foram se aprimorando, se moldando ao decorrer do tempo.”

Ao todo, aproximadamente mil papangus devem desfilar pela cidade nestes dias de Carnaval. Bezerros criou ainda seis polos de folia que passeiam do forró ao frevo, sem abrir mão do samba e do brega. Ao menos 300 artistas, entre músicos e maestros de orquestras locais, ajudam a embalar o cortejo dos mascarados.

O Carnaval do Papangu, como é chamado, já é reconhecido pelo estado como o terceiro maior de Pernambuco, atrás apenas do de Recife e Olinda. De acordo com o secretário Mateus, o evento consumiu investimento na ordem de R$ 6 milhões, divididos entre os governos federal, estadual e municipal, além de patrocínios oriundos da iniciativa privada.

Calcula-se que o mistério que esconde os papangus e atrai gente da capital pernambucana e de cidades vizinhas injete ao menos R$ 20 milhões no município nesses dias tórridos de festança.

Foi a partir do início dos anos 1900 que os papangus começaram a ganhar protagonismo nos cortejos carnavalescos de Bezerros. A tradição segue rezando a cartilha do anonimato.

“Até hoje, os foliões mascarados não são identificados. Ninguém do público que está assistindo aos desfiles sabe quem é quem. Quando questionados, eles alteram a voz para que um amigo, parente ou vizinho também não possa identificá-los”, conta Mateus. “Inclusive o jeito de andar é alterado.”

Para chegar ao formato atual, divertido e colorido, as máscaras passaram por diferentes processos criativos de produção.

Conhecido como o “pai dos papangus”, Lula Vassoureiro lembra que começou a fazer máscaras de Carnaval quando tinha apenas seis anos de idade. “Mudou muito de lá para cá e vai continuar mudando”, afirma.

O artesão aprendeu o pouco que sabe sobre ler e escrever por conta própria. Nunca frequentou a escola. Mantém um ateliê com suas obras aberto ao público, onde recebe mais ou menos 10 mil alunos por ano.

“Herdei muita coisa do meu pai, que idealizou uns 37 blocos de papangus, e de outros artistas do agreste de Pernambuco”, conta ele, cujo nome de batismo é Amaro Arnaldo do Nascimento.

Explica que as primeiras fantasias que corriam pelas ruas de Bezerros eram feitas com coité, ou melhor, com a cabaça do fruto, dura e forte, num momento em que os foliões não tinham recursos para algo mais inventivo e desfilavam com umas “roupinhas bem esfarrapadas”.

Depois, artesãos como ele passaram a utilizar o papel de embrulhar charque na confecção das máscaras. Na opinião de Vassoureiro, o artesanato daquela época mantinha características simples, sem muito adorno.

Em uma outra fase de criação e aprimoramento estético, o artesão lembra que passou a usar tecidos na confecção das máscaras, inclusive fronha de travesseiro. “Muita gente começou a se enveredar por esse caminho do uso do pano, de jeans, achando que a coisa era fácil”, recorda-se ele, sorrindo.

O boom criativo, digamos assim, surge com a entrada do uso de papel colê, que, nas palavras do artesão, “deu um colorido especial às máscaras, que ganharam maior expressividade, com o nosso trabalho feito à mão”.

No quinto ciclo, surgiu o que Vassoureiro gosta de nomear como cabeção, tipo de máscara com grandes ornamentos. Em 2007, ele próprio chegou a criar aquela que se tornaria sua maior obra em tamanho: uma máscara de 4,5 metros, confeccionada com papel machê, material que dominaria a sexta temporada inventiva das máscaras de Bezerros.

Com obras espalhadas por cerca de 70 países, patrimônio vivo de Pernambuco, Vassoureiro, aos 80 anos de idade, garante que mais um novo período fértil se avizinha. Conta que está testando e pretende ampliar o uso de fibra de vidro em suas alegorias, mantendo, por óbvio, o anonimato da brincadeira. “Nisso não se mexe.”

O Carnaval do Papangu de 2026 que o aguarde.



Leia Mais: Folha

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PPG em Educação da Ufac promove 4º Simpósio de Pesquisa — Universidade Federal do Acre

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PPG em Educação da Ufac promove 4º Simpósio de Pesquisa — Universidade Federal do Acre

A Ufac realizou, nessa terça-feira, 18, no teatro E-Amazônia, campus-sede, a abertura do 4º Simpósio de Pesquisa do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE). Com o tema “A Produção do Conhecimento, a Formação Docente e o Compromisso Social”, o evento marca os dez anos do programa e reúne estudantes, professores e pesquisadores da comunidade acadêmica. A programação terminou nesta quarta-feira, 19, com debates, mesas-redondas e apresentação de estudos que abordam os desafios e avanços da pesquisa em educação no Estado.

Representando a Reitoria, a pró-reitora de Pós-Graduação, Margarida Lima Carvalho, destacou o papel coletivo na consolidação do programa. “Não se faz um programa de pós-graduação somente com a coordenação, mas com uma equipe inteira comprometida e formada por professores dedicados.”

O coordenador do PPGE, Nádson Araújo dos Santos, reforçou a relevância histórica do momento. “Uma década pode parecer pouco diante dos longos caminhos da ciência, mas nós sabemos que dez anos em educação carregam o peso de muitas lutas, muitas conquistas e muitos sonhos coletivos.”

 

A aluna do programa, Nicoly de Lima Quintela, também ressaltou o significado acadêmico da programação e a importância do evento para a formação crítica e investigativa dos estudantes. “O simpósio não é simplesmente dois dias de palestra, mas dois dias de produção de conhecimento.” 

A palestra de abertura foi conduzida por Mariam Fabia Alves, presidente da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Anped), que discutiu os rumos da pesquisa educacional no Brasil e os desafios contemporâneos enfrentados pela área. O evento contou ainda com um espaço de homenagens, incluindo a exibição de vídeos e a entrega de placas a professores e colaboradores que contribuíram para o fortalecimento do PPGE ao longo desses dez anos.

Também participaram da solenidade o diretor do Cela, Selmo Azevedo Apontes; a presidente estadual da Associação de Política e Administração da Educação; e a coordenadora estadual da Anfope, Francisca do Nascimento Pereira Filha.

(Camila Barbosa, estagiária Ascom/Ufac)

 



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Consu da Ufac adia votação para 24/11 devido ao ponto facultativo — Universidade Federal do Acre

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A votação do Conselho Universitário (Consu) da Ufac, prevista para sexta-feira, 21, foi adiada para a próxima segunda-feira, 24. O adiamento ocorre em razão do ponto facultativo decretado pela Reitoria para esta sexta-feira, 21, após o feriado do Dia Nacional de Zumbi e da Consciência Negra.

A votação será realizada na segunda-feira, 24, a partir das 9h, por meio do sistema eletrônico do Órgão dos Colegiados Superiores. Os conselheiros deverão acessar o sistema com sua matrícula e senha institucional, selecionar a pauta em votação e registrar seu voto conforme as orientações enviadas previamente por e-mail institucional. Em caso de dúvidas, o suporte da Secrecs estará disponível antes e durante o período de votação.

 



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Professora Aline Nicolli, da Ufac, é eleita presidente da Abrapec — Universidade Federal do Acre

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Professora Aline Nicolli, da Ufac, é eleita presidente da Abrapec — Universidade Federal do Acre

A professora Aline Andréia Nicolli, do Centro de Educação, Letras e Artes (Cela) da Ufac, foi eleita presidente da Associação Brasileira de Pesquisa em Educação em Ciências (Abrapec), para o biênio 2025-2027, tornando-se a primeira representante da região Norte a assumir a presidência da entidade.

Segundo ela, sua eleição simboliza não apenas o reconhecimento de sua trajetória acadêmica (recentemente promovida ao cargo de professora titular), mas também a valorização da pesquisa produzida no Norte do país. Além disso, Aline considera que sua escolha resulta de sua ampla participação em redes de pesquisa, da produção científica qualificada e do engajamento em discussões sobre formação de professores, práticas pedagógicas e políticas públicas para o ensino de ciências.

“Essa eleição também reflete o prestígio crescente das pesquisas desenvolvidas na região Norte, reforçando a mensagem de que é possível produzir ciência rigorosa, inovadora e socialmente comprometida, mesmo diante das dificuldades operacionais e logísticas que marcam a realidade amazônica”, opinou a professora.

Aline explicou que, à frente da Abrapec, deverá conduzir iniciativas que ampliem a interlocução da associação com universidades, escolas e entidades científicas, fortalecendo a pesquisa em educação em ciências e contribuindo para a consolidação de espaços acadêmicos mais diversos, plurais e conectados aos desafios educacionais do país.

 



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