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‘Portas Abertas’: a jornada de um jovem de 19 anos que cumpriu medidas socioeducativas e abriu o próprio negócio com apoio e capacitação ofertados pelo governo

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Tácita Muniz

Recomeço. Assim define Cauã Pereira, de apenas 19 anos, a nova fase que iniciou há pouco mais de um mês, quando decidiu abrir o próprio negócio e mudar seu destino. Egresso do Centro Socioeducativo Santa Juliana, em Rio Branco, onde foi internado aos 16 anos, encontrou na unidade as oportunidades que haviam lhe faltado anteriormente.

Hoje o caso de Cauã é um exemplo de como os projetos educacionais, culturais e sociais desenvolvidos pelo Instituto Socioeducativo do Acre (ISE) podem transformar a vida de jovens que, no momento em que estão mais vulneráveis, em consequência de escolhas erradas que fizeram, aproveitam o suporte oferecido pelo governo do Estado.

Com apoio do governo do Acre, Cauã montou seu próprio negócio. Foto: Dhárcules Pinheiro/Sejusp

Proveniente de uma família de baixa renda, com oito irmãos e morador de bairro periférico, a história de Cauã não é diferente da de outros garotos cooptados pelo crime organizado. Vendo a mãe criar os filhos sozinha e passar por dificuldades, foi seduzido pelo que foi lhe apresentado como uma maneira mais rápida de ganhar dinheiro.

“As oportunidades que não tive me fizeram chegar no centro socioeducativo. Só chegando lá eu tive uma reflexão sobre minha vida”, relembra.

O trabalho desenvolvido no ISE, apostando na educação aliada à capacitação, tem impactado diretamente no número de internações nas unidades. A adesão do estado às audiência concentradas também foram um reforço para que os requisitos para a semiliberdade fossem cumpridos à risca pelos internos.

No Centro Socioeducativo Santa Juliana, jovem fez curso de barbeiro e ganhou kit profissional. Foto: Dhárcules Pinheiro/Sejusp

Portas Abertas

Atualmente há pelo menos oito projetos desenvolvidos nesses centros, com o intuito de mostrar aos internos caminhos mais construtivos.

Um deles, aprovado pela Vara de Execuções de Penas e Medidas Alternativas (Vepma) da Comarca de Rio Branco, que também direciona os recursos, é o Portas Abertas, idealizado para o período pós-medida dos socioeducandos.

O ISE, nesse caso, oferece cursos de barbearia, certificação e apoio para a saída com essa capacitação. Além disso, os jovens recebem um kit com materiais de barbeiro para iniciar os trabalhos.

Trata-se de um trabalho que envolve diversos atores, desde o Ministério Público do Acre (MPAC), o Tribunal de Justiça (TJAC), o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) e o Instituto Estadual de Educação Profissional e Tecnológica (Ieptec).

E foi justamente esse curso que deu segurança e, literalmente, abriu as portas para a nova vida do Cauã. “Lá eu tive conhecimento sobre o curso de barbeiro que estava sendo ofertado e passei a refletir que, após sair, eu poderia ter meu próprio negócio. No final de 2023, saí e fui trabalhar por comissão em uma barbearia, mas está com um mês que consegui alugar esse ponto pra mim”, conta animado.

O espaço antes era de outro dono e ainda precisa de ajustes para ficar “a cara do Cauã”. O que ele garante que é questão de tempo. O kit que ganhou do projeto, composto por uma máquina de corte, outra de acabamento, tesoura, pente, espanador, borrifador e duas capas de corte, uma para o cliente e outra para o barbeiro, avaliado em mil reais, foi o incentivo inicial para que empreendesse.

Planos para o futuro

Foi também no sistema socioeducativo que o jovem terminou seus estudos e este ano, pela primeira vez, vai prestar o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem). Vendo a vida por uma outra perspectiva, hoje Cauã sonha até com o ensino superior.

Cauã também sonha em cursar ensino superior. Foto: Dhárcules Pinheiro/Sejusp

Para Cauã, o braço do Estado nessa mudança foi essencial. “O que tenho a dizer para os jovens é que não é fácil abrir o próprio negócio, tem que se dedicar e se identificar com o que quer fazer. Eu me identifiquei com o curso de barbeiro e tive todo esse apoio do Estado. Hoje sonho em fazer uma faculdade e penso em aumentar e modificar meu espaço”, revela.

No começo deste ano, quando o sistema passou a registrar uma redução de quase 80% no número de internações nesses centros, o presidente do ISE, Mário Cesar Freitas, fez uma análise de como a união de esforços tem transformado a vida dos jovens.

“A redução do número de internações ocorre devido a diversos fatores, como maior critério do Judiciário para encaminhamento, diminuição significativa das ocorrências envolvendo menores e os impactos da pandemia de covid-19. Os índices de reincidência são baixos, decorrentes do trabalho realizado pela instituição, pelas equipes técnicas e de segurança dentro das unidades e, de maneira geral, pela Sejusp [Secretaria de Justiça e Segurança Pública] nas ruas, além da atuação do Poder Judiciário”, declarou.

Projetos educacionais e sociais impactam e mudam a vida de jovens ressocializados. Foto: Dhárcules Pinheiro/Sejusp

O impacto da educação

Para quem trabalha na ressocialização, é difícil não se emocionar com a história de Cauã, exemplar sobre como ações humanizadas podem reduzir índices negativos e gerar esperança de ver a mudança de vida de muitos jovens, por meio da presença do Estado.

A gerente de Educação e Ações Psicopedagógicas do ISE, Vicência Maria Gomes, diz que a sociedade precisa entender que um interno necessita ser recuperado. Esse trabalho é baseado no que preconiza o Estatuto da Crianças e do Adolescente (ECA) e o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase).

“São cursos que nós procuramos casar com a escolarização e com os recursos que conseguimos. Por exemplo, o projeto Portas Abertas é algo que a gente trabalha pensando na saída do adolescente do centro, porque no sistema, o governo dá todo apoio e suporte, mas lá fora o jovem precisa estar preparado para recomeçar”, explica.

A medida é importante porque, segundo ela, quando esse interno volta para casa, o assédio do crime organizado continua. Logo, é necessário que o próprio adolescente consiga solidificar uma mudança de postura e comportamento.

“Do lado de fora é um pouco mais difícil, já não está sob nossos olhos. Mas, com essa extensão, o Estado consegue apoiar o momento de pós-medida, dando condições para o jovem executar o que aprendeu no centro socioeducativo”, destaca.

Contextos de realidades

Para atender o maior número de adolescentes, os cursos, segundo o gerente de Planejamento e Projetos do ISE, Alan Antônio de Lima, são planejados observando-se o contexto social e as necessidades dos internados.

“A gente faz projetos para que eles se qualifiquem e, quando saiam, tenham a oportunidade de abrir seu próprio negócio ou até de chegar a se qualificar em algumas empresas locais, para não pegar de volta o caminho do crime”, explica.

Para Lima, os cursos técnicos são fundamentais e devem andar lado a lado com a escolarização. O intuito é devolver à sociedade um indivíduo que tenha terminado os estudos e também se qualificado. É uma equação perfeita para quem pretende recalcular a rota.

“A capacitação é um braço forte da educação, que é uma obrigação dentro do sistema. Todos [os internos] precisam estar matriculados, estudando, tanto é que todas as nossas unidades possuem um polo de alguma escola parceira. De lá, saem com a educação em dia, e, aliado a isso, a gente foca nos cursos, frutos dos nossos projetos, apresentados para dar apoio no pós-medida”, completa.

Trabalhando em uma causa nem sempre compreendida em sua amplitude pela sociedade, Lima diz que exemplos como o de Cauã mostram que ainda há esperança. Redução no número de internações e adolescentes trilhando novos caminhos são respostas ao trabalho de uma equipe que se dedica a mudar realidades.

Para equipe do ISE, história de Cauã é inspiradora. Foto: Dhárcules Pinheiro/Sejusp

“Ver o que aconteceu com o Cauã é um impulsionamento ao nosso trabalho, dá gás e ânimo para que possamos continuar, porque a gente vê nosso trabalho dando frutos. Entregamos os kits para outros jovens que vamos acompanhar, mas, com certeza, o Cauã é uma inspiração”, diz o gestor.

Definitivamente emblemática, a história do rapaz vai ser narrada em palestras e encontros nos centros socioeducativos, como forma de mostrar a tantos outros jovens que mudar o passado é impossível, mas os passos futuros dependem exclusivamente da força de vontade pessoal e da forma como o indivíduo pretende se ver no futuro.

No reencontro em sua própria barbearia, Cauã, agora fora do sistema socioeducativo, agradeceu aos dois orientadores que encontrou na unidade, que, ao ver o jovem cortando cabelos em seu empreendimento e fazendo planos para o seu negócio, deixaram transparecer a emoção. Foi um sentimento mútuo de gratidão: daqueles que fazem a mudança e de quem se permite ser impactado por ela.

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Prograd oferece curso básico de Libras para professores da Ufac — Universidade Federal do Acre

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A Pró-Reitoria de Graduação (Prograd) e a Escola de Formação da Docência, da Ufac, realizam o curso básico de língua brasileira de sinais (Libras) para professores, visando capacitá-los e promover a inclusão da comunidade surda no ambiente acadêmico. O curso, com carga horária de 45 horas, será 50% presencial e 50% online, com turmas no campus-sede e no campus Floresta, as quais oferecem 25 vagas cada.

No campus-sede haverá duas turmas, sendo a Turma 1 no período de 4 de agosto a 5 de setembro, no horário das 16h às 18h, às segundas, quartas e sextas-feiras, com a professora Claudia de Souza Martins Lima; e a Turma 2 no período de 4 a 19 de agosto, no horário das 18h às 20h, de segunda a sexta-feira, com a professora Karlene Ferreira de Souza. As inscrições estão abertas por meio de formulário online. As aulas ocorrerão na sala de reuniões da Prograd.

No campus Floresta haverá uma turma no período de 27 de julho a 29 de agosto, no horário das 18h às 20h, às segundas, quartas e sextas-feiras, com a professora Maria Aldenora dos Santos Lima. As inscrições estão abertas por meio de formulário online. As aulas ocorrerão na sala ambiente do bloco administrativo.

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17ª Semana Florestal da Ufac ocorre em setembro no campus-sede — Universidade Federal do Acre

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O programa de pós-graduação em Ciência Florestal (Ciflor) e o Programa de Educação Tutorial (PET) Floresta, da Ufac, realizam, de 1 a 5 de setembro, no anfiteatro Garibaldi Brasil, campus-sede, a 17ª Semana Florestal, com o tema “Manejo Florestal Comunitário na Amazônia”. A programação conta com palestras, mesas-redondas, minicursos, apresentações científicas, atividades culturais e visitas técnicas. As inscrições para participação, submissão de trabalhos e minicursos estão abertas no site do evento.

A semana celebra o Dia da Amazônia, em 5 de setembro, e promove diálogos sobre os desafios e oportunidades do manejo florestal sustentável na região, reunindo estudantes, pesquisadores, comunidades tradicionais, representantes de órgãos públicos, organizações da sociedade civil e empresas do setor florestal, buscando integrar ciência, inovação e saberes locais para a promoção da bioeconomia e da sustentabilidade amazônica.

Nesta edição, os participantes poderão submeter resumos expandidos, que serão publicados em um livro digital do evento. Os dez melhores trabalhos selecionados pelo comitê científico serão convidados para publicação como artigos completos em edição especial da revista “Scientia Naturalis”, ampliando a difusão dos resultados científicos produzidos.

O evento conta com apoio da Funtac, Sema, Seagri, Seplan, além de empresas e organizações locais, como a Catraia Soluções Ambientais e a Asus Engenharia.

 



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Ufac lança TV sobre plantas alimentícias não convencionais — Universidade Federal do Acre

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A Ufac lançou, nessa quarta-feira, 23, no auditório da Associação dos Docentes da Ufac (Adufac), o projeto de extensão TV Panc, uma iniciativa voltada à popularização das plantas alimentícias não convencionais (Panc) com foco na promoção de hábitos alimentares mais saudáveis e sustentáveis.

Desenvolvido por professores e alunos da instituição, o projeto une ciência, educação e comunicação para levar o conhecimento sobre as Panc a escolas públicas, comunidades e ao público em geral, com linguagem acessível, lúdica e baseada em evidências. A proposta contempla conteúdos como vídeos animados, histórias em quadrinhos e oficinas educativas, com divulgação em redes sociais como Instagram e TikTok.

O vice-reitor Josimar Batista destacou a força do projeto, a importância da valorização das mulheres nas comunidades tradicionais e a urgência de iniciativas que contribuam para combater a insegurança alimentar, sobretudo em tempos de crise climática. “Projetos como o TV Panc são fundamentais para garantir alternativas alimentares e preservar o patrimônio genético e cultural dessas comunidades”, alertou.

O pró-reitor de Extensão e Cultura, Carlos Paula de Moraes, ressaltou o papel social da universidade pública. “O fim último da universidade pública é a sociedade. A extensão só existe se tiver ensino forte e pesquisa de ponta. E o que vi aqui hoje é a tradução de um conhecimento científico para uma linguagem que alcança quem realmente precisa.” 

Durante o lançamento, a coordenadora do grupo de pesquisa Panc, Almecina Balbino Ferreira, abordou a trajetória do grupo, que há mais de oito anos desenvolve pesquisas sobre o cultivo e as propriedades nutricionais das espécies. Para ela, o projeto marca o fortalecimento do tripé universitário. “Temos ensino na graduação, pesquisa na pós e agora, com esse projeto, ampliamos a extensão, que é fundamental para romper os muros da universidade”, disse. Ela também enfatizou o aspecto afetivo e cultural do trabalho, mencionando que o resgate das Panc começou a partir das memórias alimentares da própria infância.

A coordenadora do projeto, Bruna da Costa Viana Oliveira, destacou que o TV Panc nasceu da ideia de um discente e cresceu a partir do envolvimento do grupo de pesquisa já existente na universidade. “Nosso objetivo é valorizar o que temos aqui, no nosso quintal, na floresta, nas calçadas. As Panc são uma alternativa real para promover segurança alimentar e nutricional.”

Também participaram do evento o diretor do Centro de Ciências da Saúde e do Desporto, Carlos Frank Viga Ramos; a coordenadora da Divisão de Saúde na Escola da Secretaria Municipal de Educação, Maíra Hidalgo; e a coordenadora do Laboratório de Estudos Integrados em Biodiversidade e Economia da Amazônia, Marilene Santos de Lima.

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