POLÍTICA
Tribunais de contas se consolidam como abrigo para…

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Hugo César Marques
Os tribunais de contas são órgãos auxiliares do Legislativo criados para fiscalizar o bom uso do dinheiro dos contribuintes. É uma tarefa das mais importantes. Se executada com diligência, funcionaria como uma blindagem às obras inúteis, ao desperdício, aos malfeitos e à corrupção. Os conselheiros contam com estabilidade no cargo, têm mordomias variadas e ainda se aposentam com vencimentos integrais. Há casos em que os vencimentos superam os 100 000 reais por mês. Indicados pelos governantes de plantão, os TCs, porém, costumam ser dóceis com quem tem poder, e são raras as decisões do colegiado que se revertem efetivamente em algo a favor dos cofres públicos. Essa leniência tem muito a ver com a própria composição dos tribunais, que desde sempre serviram de abrigo para amigos de políticos e políticos em fim de carreira, o que já é, por si só, um tremendo paradoxo.
Para agravar a situação, nos últimos anos, as Cortes passaram também a hospedar parentes e mulheres de políticos, alguns sem qualificação para ocupar o cargo. A polêmica mais recente a respeito dessa prática vem da Paraíba. Se nenhuma reviravolta acontecer, em breve a bacharel em direito Alanna Vieira, de 38 anos, será a mais nova conselheira do Tribunal de Contas do Estado. Estudante de medicina, ela é filha do deputado estadual Adriano Galdino (Republicanos), presidente da Assembleia Legislativa.
Como é praxe em casos assim, o Ministério Público tentou impedir a posse, argumentando que nomear parente, além de imoral, caracterizava “nepotismo indireto”, já que, formalmente, a indicação foi feita pelo governador João Azevêdo (PSB), aliado do deputado. Seguindo o protocolo, o pai argumentou que o fato de a candidata ser sua filha é irrelevante. O que importava é que ela atendia aos requisitos da lei e era preparada para a função. O caso foi parar na Justiça, um magistrado suspendeu o processo, mas a decisão foi revogada dias depois. Tudo resolvido, se não fosse um detalhe: uma auditoria do tribunal descobriu que Alanna Vieira foi, durante anos, funcionária fantasma do governo.
Em outras palavras, a provável futura conselheira encarregada de fiscalizar o bom uso do dinheiro público dos paraibanos recebia sem trabalhar. É impressionante. A estudante de medicina, segundo os auditores, ocupou o cargo de agente de programas governamentais da Secretaria de Planejamento por mais de uma década. Nesse período, ela recebeu o equivalente a 646 000 reais em salários. “Não há qualquer registro documental que possa comprovar a prestação de serviços por parte da ex-servidora. Mas, ao contrário, as evidências demonstram que a Sra. Alanna Camilla Santos Galdino Vieira sequer tinha cadastro como usuária dos sistemas informatizados utilizados pela secretaria”, diz o relatório. “Nenhum servidor entrevistado, nestes incluídos chefes imediatos, a conheceu ou tem conhecimento de trabalhos por ela realizados para a referida secretaria”, concluíram os técnicos. O Ministério Público quer que ela devolva o dinheiro recebido indevidamente. A defesa de Alanna nega irregularidades e diz que foram anexados documentos que comprovam a frequência no cargo.
A prática da nomeação de parentes para os tribunais de contas parece não ruborizar mais ninguém e, talvez por isso, tem se alastrado país afora. No governo Lula, por exemplo, há nada menos que cinco ministros, todos ex-governadores de seus respectivos estados, cujas esposas foram alçadas a conselheiras desses órgãos. Entre elas, há uma enfermeira, uma empresária e uma psicopedagoga (veja o quadro). O cargo garante uma certa tranquilidade financeira aos seus ocupantes. Um levantamento feito pelo jornal O Globo mostra que os membros dos TCEs receberam em média 69 700 reais de salário neste ano, 50% a mais do que recebe um ministro do Supremo Tribunal Federal, o teto do funcionalismo público federal. “É preciso criminalizar este tipo de nepotismo que hoje prospera numa zona cinzenta da legislação, por falta de uma regra clara”, diz o procurador de Justiça Roberto Livianu, presidente do Instituto Não Aceito Corrupção.
Há também indiscutíveis interesses que permeiam essas indicações. “O aparelhamento dos tribunais por cônjuges e parentes de autoridades mina a confiança da sociedade nesses órgãos e aumenta os riscos de seu uso político para blindar aliados, perseguir adversários e favorecer negócios privados”, adverte Renato Morgado, da Transparência Internacional. Santos de casa às vezes fazem milagres.
Publicado em VEJA de 25 de abril de 2025, edição nº 2941
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A articulação para mudar quem define o teto de jur…

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5 de maio de 2025
Nicholas Shores
O Ministério da Fazenda e os principais bancos do país trabalham em uma articulação para transferir a definição do teto de juros das linhas de consignado para o Conselho Monetário Nacional (CMN).
A ideia é que o poder de decisão sobre o custo desse tipo de crédito fique com um órgão vocacionado para a análise da conjuntura econômica.
Compõem o CMN os titulares dos ministérios da Fazenda e do Planejamento e Orçamento e da presidência do Banco Central – que, atualmente, são Fernando Haddad, Simone Tebet e Gabriel Galípolo.
A oportunidade enxergada pelos defensores da mudança é a MP 1.292 de 2025, do chamado consignado CLT. O Congresso deve instalar a comissão mista que vai analisar a proposta na próxima quarta-feira.
Uma possibilidade seria aprovar uma emenda ao texto para transferir a função ao CMN.
Hoje, o poder de definir o teto de juros das diferentes linhas de empréstimo consignado está espalhado por alguns ministérios.
Cabe ao Conselho Nacional da Previdência Social (CNPS), presidido pelo ministro da Previdência Social, Wolney Queiroz, fixar o juro máximo cobrado no consignado para pensionistas e aposentados do INSS.
A ministra da Gestão e Inovação, Esther Dweck, é quem decide o teto para os empréstimos consignados contraídos por servidores públicos federais.
Na modalidade do consignado para beneficiários do BPC-Loas, a decisão cabe ao ministro do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Wellington Dias.
Já no consignado de adiantamento do saque-aniversário do FGTS, é o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, que tem a palavra final sobre o juro máximo.
Atualmente, o teto de juros no consignado para aposentados do INSS é de 1,85% ao mês. No consignado de servidores públicos federais, o limite está fixado em 1,80% ao mês.
Segundo os defensores da transferência da decisão para o CMN, o teto “achatado” de juros faz com que, a partir de uma modelagem de risco de crédito, os bancos priorizem conceder empréstimos nessas linhas para quem ganha mais e tem menos idade – restringindo o acesso a crédito para uma parcela considerável do público-alvo desses consignados.
Ainda de acordo com essa lógica, com os contratos de juros futuros de dois anos beirando os 15% e a regra do Banco Central que proíbe que qualquer empréstimo consignado tenha rentabilidade negativa, a tendência é que o universo de tomadores elegíveis para os quais os bancos estejam dispostos a emprestar fique cada vez menor.
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