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Esquerda diverge sobre formas de recuperar eleitorado – 03/11/2024 – Poder

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Ana Luiza Albuquerque

Em outubro de 2018, a poucos dias do pleito que elegeria Jair Bolsonaro (PL) presidente, o rapper Mano Brown quebrou o clima festivo em comício de Fernando Haddad (PT) no Rio de Janeiro com uma fala crítica ao segmento. “Se somos o Partido dos Trabalhadores, tem que entender o que o povo quer. Se não sabe, volta pra base e vai procurar entender.”

Seis anos depois, a mensagem de Brown volta a circular nas redes sociais enquanto ativistas e acadêmicos se dividem a respeito dos desafios que a esquerda encontra para se reconectar com o eleitor e, principalmente, dos caminhos a serem traçados para reverter o problema.

O ponto de partida para a retomada da discussão foi a derrota do deputado federal Guilherme Boulos (PSOL) para o prefeito Ricardo Nunes (MDB) em São Paulo. Com 40,65% dos votos, o psolista praticamente repetiu o mesmo percentual de 2020, quando também perdeu no segundo turno –agora, porém, tinha mais recursos e tempo de televisão.

A frustração vai muito além da capital paulista. Neste ano, o PT conquistou 252 prefeituras no país, ficando atrás de oito partidos, especialmente do centrão. Foi mais do que em 2020, ano de pior desempenho da sigla neste século, mas muito atrás das 637 que ganhou em 2012, por exemplo.

Os motivos para as dificuldades da legenda são complexos, afirma o cientista político André Singer, professor da USP e um dos principais estudiosos do lulismo, termo que cunhou. Para ele, o desafio é desenhar um programa de governo “nas condições bastante difíceis que o capitalismo tardio impõe”.

O professor chama a atenção para o processo de desindustrialização em curso em todo o mundo, incluindo o Brasil. Processo este que dissolve os laços da antiga classe trabalhadora, que um dia se encontrou nas fábricas e pôde se unir em torno de demandas de melhores condições de trabalho e igualdade. Foi desse sindicalismo que nasceu o PT.

Com o afrouxamento destes vínculos, já que muitos trabalhadores hoje atuam por conta própria –o empreendedorismo teve enorme salto no país na última década–, desenhou-se uma nova realidade desconectada da plataforma do partido. E para a qual a esquerda precisa de adaptar, diz Singer.

“É uma realidade contra a qual a esquerda vem lutando e não pode deixar de lutar. Mas precisa desenhar um programa que dê conta”, afirma.

Um exemplo positivo, diz ele, foi a ideia de Boulos de criar pontos de apoio para entregadores de aplicativo. A proposta foi martelada no segundo turno, quando o deputado tentava crescer entre parte do eleitorado do influenciador Pablo Marçal (PRTB), que simbolizou para muitos a realização do desejo de prosperar por mérito próprio, sem depender do Estado.

“Estes centros [de apoio] têm a possibilidade de tornar uma atividade muito fragmentada numa atividade coletiva”, afirma o professor. “Podem se encontrar, trocar experiências e até se organizar para enfrentar associativamente suas condições de trabalho. Os mecanismos de solidariedade entre os trabalhadores precisam ser reconstruídos, e nada nos diz que será simples.”

Singer afirma, porém, que a ideologia do empreendedorismo não pode ser adotada pelo segmento por ir contra as premissas da esquerda, na medida em que produz mais desigualdade. “O sonho de uma grande prosperidade, ao estilo do que possivelmente se aplica a Marçal, só vai ser possível para uma minoria ínfima”, diz.

Neste sentido, defende, é preciso desenhar uma política econômica “capaz de provocar uma onda positiva”, como ocorreu, por exemplo, em 2012, quando a esquerda teve seu melhor desempenho em eleições municipais. A base da pirâmide econômica ainda está com Lula, lembra, mas o grupo perdeu tração entre setores intermediários, da classe média aos trabalhadores de plataforma.

“O que a esquerda pode oferecer? Uma perspectiva de país que supere o atraso e integre estes setores aos benefícios da civilização [como condições de trabalho dignas e proteções trabalhistas]”, diz.

Após a derrota de Boulos, voltou-se a discutir se candidatos de esquerda deveriam fazer como ele e adotar um figurino mais moderado para tentar reverter uma alta rejeição e/ou crescer entre o eleitorado de centro, disputado com a direita ou a extrema direita.

Para Singer, em termos eleitorais, a tática de moderação faz sentido, já que “setores importantes preferem uma política mais cautelosa”. “Porém, do ponto de vista de uma disputa sobre orientação da sociedade, seria importante uma sinalização na direção de um projeto mais amplo”, diz.

O filósofo Vladimir Safatle, professor da USP e suplente de deputado federal pelo PSOL, é um dos que defendem que o momento histórico de crise econômica, política e ecológica pede radicalização. “Não pode deixar a extrema direita ser a única figura da ruptura. Num horizonte como este, só o discurso de ruptura funciona”, diz.

“Na política, muitas vezes precisa radicalizar. Vão começar a ver você como uma alternativa real diante da desagregação social. Marçal quase passou para o segundo turno [dessa forma].”

Para Safatle, a tática de moderação é falida, o que ficou explícito na derrota de Boulos com a mesma porcentagem de votos de 2020. “Não se fantasia um gavião de sabiá. Vão pensar que você não é uma pessoa confiável”, afirma.

Ele diz que a “direita oligarca” se alia facilmente à extrema direita e que “é suicida organizar todas as suas ações para um eleitor que nunca conseguiu conquistar”.

Avalia, ainda, que moradores das periferias se alinham a candidatos de centro-direita porque a ação da esquerda é “completamente incoerente”. Para Safatle, um discurso mais radical não teria afastado esse grupo, que já votou no PT diversas vezes.

“O último movimento em relação ao Marçal, naturalizando o empreendedorismo, só mostra a fraqueza da nossa posição”, afirma. “Deveríamos estar falando que este é um modelo de brutalização social, cada um por si, não tem mais segurança de nada. Tinha que estar trabalhando no inverso.”

A antropóloga Rosana Pinheiro-Machado, diretora do laboratório de economia digital e extremismo político da University College Dublin, na Irlanda, diz que a esquerda trata o empreendedorismo como um tabu, deixando o campo aberto para a extrema direita, mas que há como empreender incentivando uma lógica coletiva.

“Tem muitas formas de fazer que não individualista. Como a esquerda ignora esse tema, acaba sendo suprido por uma rede de influenciadores alinhados à direita que fazem esse treinamento de grande parte da população”, afirma.

Pinheiro-Machado defende um plano nacional de empreendedorismo popular e afirma que as mudanças nas relações de trabalho não têm volta, o que vai obrigar a esquerda a se posicionar.

“As pessoas estão desesperadas buscando renda extra no Instagram porque precisam, porque querem, porque merecem”, diz. “Não dá para ter um imaginário de pleno emprego, que as pessoas vão viver com salário mínimo, ser sindicalizadas […]. O mundo está em plena reconstrução.”



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Ufac recepciona estudantes de licenciaturas que farão o Enade — Universidade Federal do Acre

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Ufac recepciona estudantes de licenciaturas que farão o Enade — Universidade Federal do Acre

A Pró-Reitoria de Graduação (Prograd) da Ufac realizou, nesta sexta-feira, 24, no Teatro Universitário, a recepção aos alunos concluintes dos cursos de licenciatura que participarão do Exame Nacional de Desempenho de Estudantes (Enade), neste domingo, 26.
O evento teve como objetivo acolher e motivar os estudantes para a realização da prova, que tem grande importância para a formação docente e para a avaliação dos cursos de graduação. Ao todo, 530 alunos participarão do Enade Licenciaturas este ano, sendo 397 em Rio Branco e 133 em Cruzeiro do Sul.
Participam do Enade Licenciaturas os concluintes dos cursos de Física, Física EaD, Letras/Português, Letras/Inglês, História, Geografia, Ciências Biológicas, Química, Matemática, Matemática EaD, Pedagogia, Ciências Sociais, Filosofia e Educação Física.

O pró-reitor de Extensão e Cultura, Carlos Paula de Moraes, que representou a reitora Guida Aquino, destacou o papel da universidade pública na formação docente e o compromisso social que acompanha o exercício do magistério. “A missão de quem se forma nesta instituição vai além do diploma. É defender a educação pública, a democracia e os direitos humanos. Vocês representam o que há de melhor na educação acreana e brasileira. Cada um de vocês é parte da história e da luta da Ufac.”

A pró-reitora de Graduação, Ednaceli Damasceno, ressaltou o caráter formativo do exame e o compromisso da universidade com a qualidade da educação. “O Enade é mais do que uma prova. Ele representa uma etapa importante da trajetória de cada estudante que trilhou sua formação nesta universidade. É um momento de reflexão sobre o aprendizado, o esforço e o legado que cada um deixa para os próximos alunos.”
Ela reforçou que o desempenho dos estudantes é determinante para o conceito de cada curso e destacou a importância da participação responsável. “É fundamental que todos façam a prova com dedicação, levando o nome da Ufac com orgulho. Nós preparamos esse encontro para motivar, orientar, e entregar um kit com lanche, água, fruta e caneta, ajudando os alunos a se organizarem para o domingo.”
A pró-reitora lembrou ainda que a mesma ação está sendo realizada no campus Floresta, em Cruzeiro do Sul, com o apoio da equipe da Prograd e dos coordenadores locais. “Lá, os alunos estão distribuídos em três escolas, e nossa equipe vai acompanhá-los no dia da prova, garantindo o mesmo acolhimento e suporte.”

O evento contou com apresentação cultural da cantora Luzienne Lucena e do Grupo Vibe, do projeto Pró-Cultura Estudantil, formado pelos acadêmicos Gabriel Daniel (Sistemas de Informação), Geovanna Maria (Teatro) e Lucas Santos (Música).
Também participaram da solenidade a diretora de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino, Grace Gotelip; e os coordenadores de cursos de licenciatura: Francisca do Nascimento Pereira Filha (Pedagogia), Lucilene Almeida (Geografia) e Alcides Loureiro Santos (Química).

 



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Ufac promove ação de autocuidado para servidoras e terceirizadas — Universidade Federal do Acre

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Ufac promove ação de autocuidado para servidoras e terceirizadas — Universidade Federal do Acre

A Coordenadoria de Vigilância à Saúde do Servidor (CVSS) da Ufac realizou, nesta quinta-feira, 23, o evento “Cuidar de Si É um Ato de Amor”, em alusão à Campanha Outubro Rosa. A atividade ocorreu no Setor Médico Pericial e teve como público-alvo servidoras técnico-administrativas, docentes e trabalhadoras terceirizadas.

A ação buscou reforçar a importância do autocuidado e da atenção integral à saúde da mulher, indo além da prevenção e do diagnóstico precoce do câncer de mama e do colo do útero. O objetivo foi promover um momento de acolhimento e bem-estar, integrando ações de valorização e promoção da saúde no ambiente de trabalho.

“O mês de outubro não deve ser apenas um momento de lembrar dos exames preventivos, mas também de refletir sobre o cuidado com a saúde como um todo”, disse a coordenadora da CVSS, Priscila Oliveira de Miranda. Ela ressaltou que muitas mulheres acabam se sobrecarregando com as demandas da casa, da família e do trabalho e acabam deixando o autocuidado em segundo plano.

Priscila também explicou que a iniciativa buscou proporcionar um espaço de pausa e acolhimento no ambiente de trabalho. “Nem sempre é fácil parar para se cuidar ou ter acesso a ações de relaxamento e promoção da saúde. Por isso, organizamos esse momento para que as servidoras possam respirar e se dedicar a si mesmas.” 

O setor mantém atividades contínuas, como consultas com clínico-geral, nutricionista e fonoaudióloga, além de grupos de caminhada e ações voltadas à saúde mental. “Essas iniciativas estão sempre disponíveis. É importante que as mulheres participem e mantenham o compromisso com o próprio bem-estar”, completou.

A programação contou com acolhimento, roda de conversa mediada pela assistente social Kayla Monique, lanche compartilhado e o momento “Cuidando de Si”, com acupuntura, auriculoterapia, reflexologia podal, ventosaterapia e orientações de cuidados com a pele. A ação teve parceria da Liga Acadêmica de Práticas Integrativas e Complementares em Saúde e da especialista em bem-estar Marciane Villeme.

 



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Ufac realiza abertura do Fórum Permanente da Graduação — Universidade Federal do Acre

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Ufac realiza abertura do Fórum Permanente da Graduação — Universidade Federal do Acre

A Pró-Reitoria de Graduação (Prograd) da Ufac realizou, nesta terça-feira, 21, no anfiteatro Garibaldi Brasil, campus-sede, a abertura do Fórum Permanente da Graduação. O evento visa promover a reflexão e o diálogo sobre políticas e diretrizes que fortalecem o ensino de graduação na instituição.

Com o tema “O Compromisso Social da Universidade Pública: Desafios, Práticas e Perspectivas Transformadoras”, a programação reúne conferências, mesas temáticas e fóruns de discussão. A abertura contou com apresentação cultural do Trio Caribe, formado pelos músicos James, Nilton e Eullis, em parceria com a Fundação de Cultura Elias Mansour.
O pró-reitor de Extensão e Cultura, Carlos Paula de Moraes, representou a reitora Guida Aquino. Ele destacou o papel da universidade pública diante dos desafios orçamentários e institucionais. “Em 2025, conseguimos destinar R$ 10 milhões de emendas parlamentares para custeio, algo inédito em 61 anos de história.”

Para ele, a curricularização da extensão representa uma oportunidade de aproximar a formação acadêmica das demandas sociais. “A universidade pública tem potencial para ser uma plataforma de políticas públicas”, disse. “Precisamos formar jovens críticos, conscientes do território e dos problemas que enfrentamos.”
A pró-reitora de Graduação, Ednaceli Damasceno, ressaltou que o fórum reúne coordenadores e docentes dos cursos de bacharelado e licenciatura, incluindo representantes do campus de Cruzeiro do Sul. “O encontro trata de temáticas comuns aos cursos, como estágio supervisionado e curricularização da extensão. Queremos sair daqui com propostas de reformulação dos projetos de curso, alinhando a formação às expectativas e realidades dos nossos alunos.”
A conferência de abertura foi ministrada pelo professor Diêgo Madureira de Oliveira, da Universidade de Brasília, que abordou os desafios e as transformações da formação universitária diante das novas demandas sociais. Ao final do fórum, será elaborada uma carta de encaminhamentos à Prograd, que servirá de base para o planejamento acadêmico de 2026.
Também participaram da solenidade de abertura a diretora de Apoio ao Desenvolvimento do Ensino, Grace Gotelip; o diretor do CCSD, Carlos Frank Viga Ramos; e o vice-diretor do CMulti, do campus Floresta, Tiago Jorge.



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