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Lacalle Pou: Não há dicotomia entre Estado e livre mercado – 31/10/2024 – Mundo

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Mayara Paixão

“Algo mais a nos dizer, presidente?”. “Não, vocês já me espremeram como se faz com as laranjas”, responde sorrindo Luis Lacalle Pou, 51, em seu escritório. O presidente do Uruguai muito raramente concede entrevistas extensas.

Enquanto toma seu mate com Montevidéu e o rio da Prata ao fundo, ele recebe a reportagem dois dias após o primeiro turno das eleições que definirão seu sucessor. “Por que aceitou a entrevista agora?”. “Não sei, sempre priorizei falar apenas quando tenho o que dizer.”

Calculando cada palavra que empregará ao responder nas vezes em que é questionado sobre a conduta de outros presidentes, Lacalle Pou fala sobre a relação com o Brasil, sobre o Mercosul e a Venezuela.

Do tradicional Partido Nacional, de centro-direita, ele rompeu uma sequência de 15 anos de governos de esquerda no Uruguai ao assumir o cargo em 2020. A direita uruguaia destoa de muitas outras direitas regionais. “Qual a receita? É que há discussões que já não se fazem, como a falsa dicotomia tuiteira entre o Estado e o livre mercado.”

Lacalle Pou deixará o cargo em março de 2025, quando o retorno da democracia completa 40 anos no país. Pela Constituição, não poderia concorrer a reeleição consecutiva. Voltará a tentar o cargo em 2029?

“O que eu quero é trocar poder por autoridade. O poder é formal. A autoridade é moral. E isso é um vínculo muito bonito com as pessoas.”

Interlocutores dos governos dizem que, em três horas com Lula, o senhor fez mais do que em três anos com Bolsonaro.

Eu me relaciono com os interesses nacionais. Não importa a ideologia do outro presidente, importa a consonância que haja no que nosso país precisa. Com o presidente Bolsonaro, nos relacionamos durante uma crise [a pandemia de Covid].

Quando o senhor agiu de maneira muito distinta à de Bolsonaro.

Sim, lidamos à uruguaia, confiando nos uruguaios, não gosto de opinar sobre o que os outros fizeram em outro país.

Tivemos acordo em temas internacionais. O ministro Paulo Guedes [Economia] e o próprio Bolsonaro concordavam que o Uruguai podia assinar acordos bilaterais com outros países, como com a China.

Com o presidente Lula tive a oportunidade de ter um vínculo no início de seu governo, o que é determinante. Falamos, basicamente, de cinco temas. Dois eram sobre Uruguai com o Mercosul e com a China, e três eram pontuais. Neles, Lula não só concordou como agiu.

A binacionalidade do aeroporto de Rivera, a construção de uma nova ponte sobre o rio Jaguarão, e o canal de São Gonçalo, que nos permite sair por um porto brasileiro. Alguém dirá que é perda de soberania não sair pelo porto de Montevidéu e sair pelo Rio Grande do Sul. Soberania é ser competitivo no mundo.

Com o presidente Lula tive um bom vínculo. E para mim os vínculos se constroem no cumprimento do acordado reciprocamente. Ideologicamente o presidente Lula e eu não coincidimos em nada, mas, com o Uruguai, ele cumpriu.

Os presidentes dos vizinhos do Uruguai, Javier Milei e Lula, não se falam. Esse tipo de relação gera danos à região?

Motivos para discutir sobram no mundo. Uma das funções vitais de um chefe de Estado é unir seu país e, depois, tentar unir a região e o mundo. Se um político não tem como princípio base a união, não entendeu a vocação de serviço. E acredite que me surpreende quando vejo muitos líderes mundiais que fazem da divisão um instrumento político.

É o que está fazendo Milei.

Eu não quero colocar nomes. Há estratégias e táticas. [Essa] não é a minha. Meu dever como Presidente da República era representar a maior quantidade de uruguaios.

Se ideologicamente não posso fazer isso, pelo menos há o fator de unidade, mesmo na discrepância. Agora, para fazer isso é preciso ter muita segurança em si mesmo, no que está fazendo e no projeto. Quando alguém sente fraqueza, levanta muros e não constrói pontes.

Algumas direitas na região estão mais radicalizadas. No Uruguai a direita tradicional segue democrática. O que teria a ensinar?

Como está a esquerda, não? O radicalismo e a divisão não têm lado ideológico. Os populismos também não têm. No Uruguai você não vai encontrar muita gente que diga que é de direita. E de fato a coalizão que formamos é de centro-direita e de centro-esquerda. Qual é a receita uruguaia? É que há discussões que já não se fazem.

Por exemplo?

A falsa dicotomia tuiteira entre o Estado e o livre mercado. Empresários e empreendedores se beneficiam de políticas de Estado. Não há uma luta ideológica entre o livre mercado e o Estado. Ao contrário, eles têm uma complementaridade. A fortaleza do Estado uruguaio é indiscutível. Fortaleza que não necessariamente significa tamanho.

Quem hoje em dia diria que não deve haver uma educação pública forte? Que não deve haver uma saúde pública forte? Essa discussão é totalmente teórica e não se atreve a tocar a realidade.

Falamos com a campanha de Yamandú Orsi [candidato da Frente Ampla à Presidência], e o plano deles é frear o acordo com a China.

É que hoje já está parado por ação do Brasil e da Argentina. Todos sabem que tanto Brasil quanto Argentina haviam falado com a China, feito todas as movimentações diplomáticas para que o Uruguai não pudesse assinar um acordo bilateral.

O chanceler Mauro Vieira disse que isso acabaria com o Mercosul.

Sim, e eu não concordo. Acho que o Brasil tem uma concepção que carrega, que é a supremacia na região. De alguma forma, não quer que um sócio do Mercosul tenha a bilateralidade com a China.

Agora, hoje no Brasil existe um fenômeno interessante que é o crescimento econômico e de peso específico do Mato Grosso. Antes as indústrias paulistas tinham mais peso, hoje o Mato Grosso o tem. Em algum momento vão começar a ter sua forte pressão natural para que a China compre sem tarifas. Acho que estamos em um momento interessante em que os tempos dos países não são os mesmos. Que o Uruguai comece e depois que os outros sócios se juntem.

No Mercosul o governo de Milei tem bloqueado debates de gênero, justiça social, Agenda 2030. Como vê essa agenda ideológica?

Sempre me neguei a participar de blocos ideologizados. Se essa é a nossa visão, para que ideologizar um Mercosul que já tem suas dificuldades sem estar direcionado para avançar? O que ganhamos? Desunião. Não parece muito lógico. Pelo menos se alguém entende a função política como a criação e não a destruição.

Os diplomatas uruguaios elevaram o tom contra o que tem acontecido na Venezuela. Como analisa o que acontece na ditadura de Maduro e a negociação natimorta de Colômbia e Brasil?

Para dançar é preciso dois. Uma das partes não quer dançar. E é Maduro. Maduro não tem nenhuma intenção de sair do poder. Suas práticas antidemocráticas e de violação dos direitos humanos se estendem por tanto tempo e para tanta gente que se fecham todas as portas de saída. Então, como podem terminar? Com uma revolução interna, que até o momento parece não haver, porque na minha visão eles [o regime] estão intimamente vinculados ao lado empresarial.

Acho que falta mais compromisso de alguns países. É óbvio que o peso relativo dos Estados Unidos não é o mesmo que o peso relativo do Uruguai. Acho que os EUA têm muito mais a fazer.

Depois de cinco anos de governo, o sr. sai com uma aprovação muito boa. Tem arrependimentos?

Se me pergunta se estou satisfeito? Não. A conformidade não deve ser uma das sensações de um governante. Realmente governei para todos. Enquanto houver um com fome, um sem casa, um sem trabalho, um que não tenha acesso à saúde, não posso estar satisfeito.

Claro que gostaria de ter feito um pouco diferente, mas a política é a arte do possível. Quando me olho no espelho, não tenho que olhar para o outro lado. Quando apoio a orelha no travesseiro, não fico desconfortável. Para mim, são duas coisas determinantes.

Atuamos muito no povoado pequeno, que sempre foi de alguma forma relegado. A descentralização é também um elemento de justiça social: aproximar o Estado forte das comunidades menores.

Nestes cinco anos tivemos alguns casos de corrupção de pessoas muito próximas ao sr. Sua imagem pessoal como líder não parece ser sido afetada. Qual o balanço?

Não há um membro do governo processado ou condenado. Quando existiam situações equivocadas, o governo foi contundente. Retirou de seus cargos, tomou as medidas correspondentes. Não dou como certa a afirmação de que houve corrupção. Incompatibilidades com a lei, sei que ocorreram, e agimos contra elas.

O ex-presidente Pepe Mujica, de esquerda, não está bem de saúde. Alguma mensagem sobre a relação com ele?

Claramente não temos a mesma visão sobre uma grande quantidade de coisas do país e do ser humano. Mas há respeito a um ex-presidente da República do meu país.

Quando Lula assumiu, o presidente Mujica poderia ter ido sozinho a Brasília, porque ele tem um vínculo com Lula, mas fomos juntos, e foi um bom gesto que faz bem ao país. Depois, quando estávamos lado a lado nos 50 anos do golpe de Estado.

A palavra é união. E isso tem sido cumprido quase sempre ou sempre, pelo menos na democracia. No Uruguai, o sangue não chega ao rio. Não quer dizer que não haja sangue. Mas não vamos até as últimas consequências, há um freio que, mais que político, é um freio popular.

Voltará a tentar a Presidência em 2029?

Eu sou um ser político. Não entendo minha vida afastado da política. Há sentimentos muito humanos que é preciso saber domar, que é o ego, a ânsia de poder.

Alguém pode garantir que eu em 2029 vou querer isso? Eu não posso garantir. Só posso garantir que vou estar perto das pessoas e da política porque me faz sentir uma pessoa melhor.

Se você me dissesse o que eu quero, quase como um segredo e confissão: trocar poder por autoridade. O poder é formal. Te é dado pela população, quando te elege, pela Constituição e pelas leis. A autoridade é intelectual, afetiva e moral, não há Constituição nem lei que te dê. E isso é um vínculo muito bonito com as pessoas.


Raio-X | Luis Lacalle Pou, 51

Presidente do Uruguai desde março de 2020, é advogado e membro do Partido Nacional. Filho do ex-presidente Luis Alberto Lacalle e da senadora Julia Pou, vem de uma tradicional família política. Durante seu mandato, destacou-se na resposta à pandemia.



Leia Mais: Folha

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Ufac promove confraternização estudantil no Restaurante Universitário — Universidade Federal do Acre

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Ufac promove confraternização estudantil no Restaurante Universitário — Universidade Federal do Acre

Ufac, por meio da Pró-Reitoria de Assuntos Estudantis (Proaes), promove nesta quinta-feira, 4, a confraternização de fim de ano destinada aos estudantes do campus-sede, em Rio Branco. A atividade ocorre no Restaurante Universitário (RU) durante o almoço, a partir das 11h, e no jantar, a partir das 17h30.

A ação integra a política de acolhimento estudantil da instituição, que envolve tanto a recepção de ingressantes quanto a oferta de atividades voltadas ao bem-estar e à permanência dos estudantes ao longo do ano.

Segundo o pró-reitor de Assuntos Estudantis, professor Isaac Dayan Bastos da Silva, a confraternização já se tornou uma tradição institucional, reforçando o vínculo entre a universidade e sua comunidade acadêmica. “Esse acolhimento faz parte da política estudantil da gestão. No final do ano, realizamos essa confraternização tanto no almoço quanto no jantar, algo que já se tornou cultural para nós”, afirmou.

Como parte da programação, o RU oferece almoço e jantar especiais, incluindo a entrega de panetone como sobremesa. O ambiente também recebe decoração temática e contará com música ao vivo, realizada pelos bolsistas do projeto Pró-Cultura Estudantil, responsáveis pela tradicional cantata de Natal.

“Tudo isso é pensado para fortalecer esse acolhimento. Buscamos criar um ambiente festivo, com decoração e música ao vivo, para que os estudantes se sintam parte desse momento de encerramento das atividades do ano”, destacou o pró-reitor.

A confraternização permanece aberta aos estudantes regularmente atendidos pelo RU durante os horários habituais de funcionamento.

(Fhagner Soares, estagiário Ascom/Ufac)



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Ufac recebe equipamentos para Laboratórios de Toxicologia e Farmácia Viva — Universidade Federal do Acre

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Ufac recebe equipamentos para Laboratórios de Toxicologia e Farmácia Viva — Universidade Federal do Acre

A Ufac realizou nesta segunda-feira, 1º, na sala ambiente do bloco de Nutrição, a entrega oficial do material destinado ao Laboratório de Toxicologia Analítica e ao Projeto Farmácia Viva, reforçando a infraestrutura científica da instituição e ampliando o suporte às ações de ensino, pesquisa e extensão.

A ação integra o Projeto de Implantação do Laboratório de Toxicologia Analítica, que recebeu a doação de 21 equipamentos permanentes, adquiridos com recursos do Ministério Público do Trabalho da 14ª Região (MPT-14), mediante autorização da Primeira Vara Federal do Acre. A iniciativa reconhece o interesse público e a relevância social das atividades desenvolvidas pela Universidade Federal do Acre, especialmente nas áreas da saúde, inovação científica e desenvolvimento regional.

Os equipamentos recebidos fortalecem duas frentes estratégicas da instituição. No âmbito do Projeto Farmácia Viva, eles ampliam a capacidade de cultivo, processamento e controle de qualidade de plantas medicinais, reforçando também as ações de extensão voltadas à promoção da saúde e ao uso racional de fitoterápicos. Já na área de toxicologia analítica, os novos aparelhos permitem o desenvolvimento e validação de métodos de análise, o processamento de matrizes biológicas e ambientais e o suporte a investigações científicas e forenses.

“Parabenizo os três professores que estão à frente desse projeto: a professora Marta Adelino, Dayan Marques e Anne Grace. Isso moderniza nossa universidade e representa um salto qualitativo na formação de profissionais”,  afirma a reitora Guida Aquino.

O professor Dayan de Araújo Marques, docente do Centro de Ciências da Saúde e do Desporto (CCSD) e farmacêutico industrial, realizou a apresentação das fases do projeto. Ele destacou que a parceria com o MPT-14 representa a consolidação de um espaço científico. “Essa consolidação é capaz de oferecer respostas mais rápidas e precisas às demandas de saúde e meio ambiente no Acre, reduzindo a dependência de laboratórios externos e ampliando o impacto social das pesquisas desenvolvidas na universidade”.

Com a entrega desse conjunto tecnológico, a instituição eleva seu potencial de atuação laboratorial e reafirma o compromisso com a produção de conhecimento e o atendimento às demandas da sociedade acreana.

Também compuseram o dispositivo de honra o Pró Reitor de Extensão e Cultura, Carlos Paula de Moraes; a coordenadora do projeto do laboratório de toxicologia analítica, Marta Adelino da Silva Faria; a procuradora do Trabalho, representando o ministério público, Ana Paula Pinheiro de Carvalho.

 



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Curso de Medicina Veterinária da Ufac promove 4ª edição do Universo VET — Universidade Federal do Acre

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Curso de Medicina Veterinária da Ufac promove 4ª edição do Universo VET — Universidade Federal do Acre

As escolas da rede municipal realizam visitas guiadas aos espaços temáticos montados especialmente para o evento. A programação inclui dois planetários, salas ambientadas, mostras de esqueletos de animais, estudos de células, exposição de animais de fazenda, jogos educativos e outras atividades voltadas à popularização da ciência.

A pró-reitora de Inovação e Tecnologia, Almecina Balbino, acompanhou o evento. “O Universo VET evidencia três pilares fundamentais: pesquisa, que é a base do que fazemos; extensão, que leva o conhecimento para além dos muros da Ufac; e inovação, essencial para o avanço das áreas científicas”, afirmou. “Tecnologias como robótica e inteligência artificial mostram como a inovação transforma nossa capacidade de pesquisa e ensino.”

A coordenadora do Universo VET, professora Tamyres Izarelly, destacou o caráter formativo e extensionista da iniciativa. “Estamos na quarta edição e conseguimos atender à comunidade interna e externa, que está bastante engajada no projeto”, afirmou. “Todo o curso de Medicina Veterinária participa, além de colaboradores da Química, Engenharia Elétrica e outras áreas que abraçaram o projeto para complementá-lo.”

Ela também reforçou o compromisso da universidade com a democratização do conhecimento. “Nosso objetivo é proporcionar um dia diferente, com aprendizado, diversão, jogos e experiências que muitos estudantes não têm a oportunidade de vivenciar em sala de aula”, disse. “A extensão é um dos pilares da universidade, e é ela que move nossas ações aqui.”

A programação do Universo VET segue ao longo do dia, com atividades interativas para estudantes e visitantes.

(Fhagner Soares, estagiário Ascom/Ufac)



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