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Liberado pela Justiça, José Dirceu prepara volta à…

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Liberado pela Justiça, José Dirceu prepara volta à...

Laísa Dall’Agnol

Na terça-feira 18, o Congresso estava agitado por causa de um evento solene para lembrar as quatro décadas da redemocratização do país. O ex-­presidente José Sarney, aos 94 anos, era a estrela da festa, mas outro nome também chamava atenção. “Meu caro amigo Zé Dirceu”, disse Sarney ao se dirigir ao ex-ministro José Dirceu, que circulava com desenvoltura pelo local. Senadores, deputados e até um ministro (Juscelino Filho, das Comunicações) aguardaram na fila para cumprimentar o petista. Não foi a única ocasião recente em que mereceu esse tipo de atenção. Uma semana antes, ele reunira gente graduada da política em Brasília para comemorar seu aniversário de 79 anos, como o ex-pre­sidente da Câmara Arthur Lira, o atual, Hugo Motta, e treze ministros, entre eles Rui Costa e Fernando Had­dad. Três dias depois, encontrou Lula e outros grão-petistas em festa na casa da ex-prefeita Marta Suplicy em São Paulo. No dia seguinte, ainda na capital paulista, tirou centenas de fotos com militantes durante uma feijoada em espaço do MST.

MILITANTE - Com caciques do PT em evento em Brasília: interação cada vez maior com dirigentes nos bastidores da sigla (Alessandro Dantas/PT/.)

Em dois desses eventos, Dirceu foi chamado o tempo todo de “comandante” — uma alusão aos tempos de exílio da ditadura, quando recebeu treinamento militar em Cuba. Discursou e mandou recados claros. O principal é a necessidade de uma aliança robusta, que vá além dos limites da esquerda e chegue até a direita, para não só apoiar a reeleição de Lula, mas ajudar o petista a governar. “Não é que não devemos criticar, que não podemos discutir erros e insuficiências, mas temos que lembrar que estamos vendo um governo sitiado. Portanto, ele precisa de apoio”, defendeu em Brasília. Disse também de forma bastante enfática que o principal adversário na disputa eleitoral do ano que vem será o bolsonarismo e alertou sobre o risco de derrota nas urnas. E apontou para aquele que considera o nome mais forte da direita: o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), que para ele será candidato ao Palácio do Planalto. “Não tenhamos ilusões sobre as intenções e objetivos do bolsonarismo. Setores da direita brasileira começam a dormir com o inimigo e apresentam Tarcísio como se fosse uma alternativa ao bolsonarismo, quando, na verdade, ele é o próprio bolsonarismo”, afirmou. Apesar do alerta, tentou mobilizar a militância para a vitória. “Começa a se criar uma imagem de que vamos perder a eleição, que o Tarcísio vai ser eleito. Vai nada. Vamos ganhar as eleições em 2026”, disse em São Paulo, mencionando a tentativa do governador de passar uma imagem de moderação para o centro político.

LAVA-JATO - Preso: Gilmar Mendes anulou todos os processos no ano passado
LAVA-JATO - Preso: Gilmar Mendes anulou todos os processos no ano passado (Hedeson Alves/EFE)

O retorno de um dos mais influentes dirigentes da história do PT à arena tem o aval direto de Lula. Nos encontros, Dirceu tem dito a quem pode ouvir que recebeu duas missões do presidente. Uma delas é voltar à política, sendo candidato a deputado federal na eleição de 2026. O histórico de Dirceu nas campanhas para o cargo ajuda. Em 1990, na primeira disputa, se elegeu com 35 000 votos; saltou para 113 000 em 1998 (em 1994, ele disputou o governo paulista); e chegou a mais de 556 000 em 2002, quando foi o segundo mais votado em São Paulo, atrás apenas do outsider Enéas Carneiro, que teve cerca de 1,6 milhão. Dirceu desconversa sobre seus planos, diz que vai anunciar sua decisão no fim do ano porque, segundo ele, quem lança candidatura muito antes vira alvo da oposição. Mas ninguém duvida que ele irá para o jogo, até porque enxerga na iniciativa uma maneira de virar a página de uma carreira manchada pelos seguidos escândalos em que se envolveu. Em 2005, ele deixou a Câmara após ter o mandato cassado em decorrência do mensalão, como ficou conhecido o esquema de compra de votos para garantir apoio ao governo Lula — como ministro da Casa Civil, ele teria sido o grande articulador.

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O outro pedido feito por Lula é menos pessoal e mais complicado: unir o PT. Um dos objetivos de Dirceu, anunciado pelo próprio, é levar o ex-ministro e ex-prefeito Edinho Silva ao comando da legenda a partir de julho, quando o partido renovará sua direção. Apesar de ser apoiado por Lula e integrar a corrente majoritária Construindo um Novo Brasil, Edinho enfrenta resistências a seu nome, em especial do grupo ligado à ex-presidente da agremiação e hoje ministra de Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann. O candidato de Lula pode enfrentar um adversário de peso no PT, como o deputado Rui Falcão, que já presidiu a sigla e se movimenta fortemente nos bastidores para lançar candidatura. “Estou coletando assinaturas”, afirma ele. Apesar de próximo a Lula, Falcão tem um discurso à esquerda e é contra qualquer inclinação ao centro. “O partido não pode ser reduzido a um braço institucional do governo de frente ampla”, defendeu em carta aberta aos militantes. Dentro de uma visão mais pragmática, Dirceu, além de apoiar Edinho, vem entoando nas reuniões o mantra de que a sigla deve caminhar com aliados de centro e direita se quiser derrotar o bolsonarismo.

APOIO - Edinho Silva, em evento do PT em Ribeirão Preto (SP): Lula pediu a Dirceu que o ajude a vencer eleição no partido
APOIO - Edinho Silva, em evento do PT em Ribeirão Preto (SP): Lula pediu a Dirceu que o ajude a vencer eleição no partido (./Divulgação)

Tal qual seu líder, que saiu de um período de 580 dias na cadeia em Curitiba para conquistar seu terceiro mandato presidencial, Dirceu sonha com uma reviravolta política. Primeiro, ele foi condenado no mensalão a mais de dez anos de detenção em 2012 — foi encarcerado em 2013, ganhou prisão domiciliar em 2014 e teve a pena perdoada em 2016 pelo então relator das execuções penais do mensalão no STF, Luís Roberto Barroso, com base em um decreto de indulto natalino assinado por Dilma Rousseff. Dirceu nem chegou a gozar do perdão, porque já estava preso de novo, desde agosto de 2015, por ordem do juiz Sergio Moro, dentro da Lava-Jato, acusado de receber propina em esquema envolvendo a Petrobras. Em 2016, foi condenado a mais de 23 anos de prisão pelo caso. No ano seguinte, nova condenação, em outro processo de corrupção envolvendo a petrolífera, elevou para 31 anos o período que teria que passar trancafiado. Ele seria solto pelo STF em maio de 2017, voltaria à prisão em maio de 2018 e de lá sairia definitivamente um mês depois. No período, ficou detido no Complexo Médico de São José dos Pinhais (PR) e na Papuda, no DF. Após pequenas decisões favoráveis na Justiça, obteve sua maior vitória em outubro de 2024, quando o ministro Gilmar Mendes anulou todos os processos da Lava-Ja­to contra ele pelo mesmo motivo que beneficiara Lula: o papel de Moro como juiz. “Diante do conjunto de indícios de suspeição narrados nesta decisão, é certo que a mesma falta de isenção que havia em relação ao primeiro réu (Lula) também impediu que José Dirceu tivesse direito a um julgamento justo e imparcial”, escreveu Gilmar. Com as anulações, Dirceu limpou sua ficha, o que lhe permite voltar ao jogo eleitoral, do qual não participa como candidato desde 2002.

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ESTREIA - Detido em 1968 pela ditadura: a primeira das várias prisões do petista
ESTREIA - Detido em 1968 pela ditadura: a primeira das várias prisões do petista (./Divulgação)

Dirceu é também um sobrevivente na política por outros motivos. Líder estudantil, foi preso pela ditadura no histórico congresso da UNE (União Nacional dos Estudantes) em Ibiúna (SP), em 1968, quando tinha 22 anos. Ficou em unidades destinadas à repressão política até 1969, quando foi um dos quinze presos libertados em troca da soltura do embaixador dos EUA, Charles Burke Elbrick, sequestrado por grupos armados de esquerda. Foi para Cuba, de onde regressou em 1975, após uma cirurgia plástica no rosto. Sob o nome de Carlos Henrique Gouvea de Mello, foi levar a vida em Cruzeiro do Oeste (PR). Só revelou quem era em 1979, após a Lei da Anistia, para surpresa da mulher, Clara Becker, com quem tinha um filho, o hoje deputado federal Zeca Dirceu (PT-­PR). Mudou para São Paulo, desfez a cirurgia plástica, ajudou a fundar o PT, se elegeu deputado estadual e pouco tempo depois estava comandando o partido, em 1995 — ele ocupava o cargo quando Lula chegou pela primeira vez à Presidência, em 2002.

Em seu retorno à política, bastante festejado pelos companheiros, Dirceu terá ainda vários desafios pela frente. Para boa parte do eleitorado, ele é ainda uma espécie de símbolo dos casos de corrupção que mancharam a imagem do PT. Ele precisa ainda pacificar o partido em meio à disputa pelo comando da sigla, ajudar um governo em mau momento e convencer a esquerda a aceitar a ideia de uma frente ampla que não deixe o partido isolado para 2026. Nas próximas semanas, vai continuar seu trabalho político de bastidores em Brasília e São Paulo, além de viajar pelo país na campanha de Edinho Silva. Depois, lançado candidato à Câmara, o objetivo será ajudar a eleger o maior número possível de aliados no Parlamento para eventual novo mandato de Lula. “Se queremos mudar o Brasil, temos que mudar o Congresso”, disse durante festa com militantes em São Paulo. Não são poucas as batalhas pela frente do “comandante” em sua volta ao front político.

Publicado em VEJA de 21 de março de 2025, edição nº 2936



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A articulação para mudar quem define o teto de jur…

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A articulação para mudar quem define o teto de jur...

Nicholas Shores

O Ministério da Fazenda e os principais bancos do país trabalham em uma articulação para transferir a definição do teto de juros das linhas de consignado para o Conselho Monetário Nacional (CMN). 

A ideia é que o poder de decisão sobre o custo desse tipo de crédito fique com um órgão vocacionado para a análise da conjuntura econômica. 

Compõem o CMN os titulares dos ministérios da Fazenda e do Planejamento e Orçamento e da presidência do Banco Central – que, atualmente, são Fernando Haddad, Simone Tebet e Gabriel Galípolo.

A oportunidade enxergada pelos defensores da mudança é a MP 1.292 de 2025, do chamado consignado CLT. O Congresso deve instalar a comissão mista que vai analisar a proposta na próxima quarta-feira. 

Uma possibilidade seria aprovar uma emenda ao texto para transferir a função ao CMN.

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Hoje, o poder de definir o teto de juros das diferentes linhas de empréstimo consignado está espalhado por alguns ministérios. 

Cabe ao Conselho Nacional da Previdência Social (CNPS), presidido pelo ministro da Previdência Social, Wolney Queiroz, fixar o juro máximo cobrado no consignado para pensionistas e aposentados do INSS.

A ministra da Gestão e Inovação, Esther Dweck, é quem decide o teto para os empréstimos consignados contraídos por servidores públicos federais.

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Na modalidade do consignado para beneficiários do BPC-Loas, a decisão cabe ao ministro do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Wellington Dias.

Já no consignado de adiantamento do saque-aniversário do FGTS, é o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, que tem a palavra final sobre o juro máximo.

Atualmente, o teto de juros no consignado para aposentados do INSS é de 1,85% ao mês. No consignado de servidores públicos federais, o limite está fixado em 1,80% ao mês.

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Segundo os defensores da transferência da decisão para o CMN, o teto “achatado” de juros faz com que, a partir de uma modelagem de risco de crédito, os bancos priorizem conceder empréstimos nessas linhas para quem ganha mais e tem menos idade – restringindo o acesso a crédito para uma parcela considerável do público-alvo desses consignados.

Ainda de acordo com essa lógica, com os contratos de juros futuros de dois anos beirando os 15% e a regra do Banco Central que proíbe que qualquer empréstimo consignado tenha rentabilidade negativa, a tendência é que o universo de tomadores elegíveis para os quais os bancos estejam dispostos a emprestar fique cada vez menor.



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