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Não deu para segurar: os bastidores da queda de Ju…

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Marcela Mattos
O terceiro mandato de Lula mal havia começado quando, ainda em janeiro de 2023, soube-se que o novo ministro das Comunicações, Juscelino Filho, tinha direcionado 5 milhões de reais em 2020, enquanto era deputado federal, para pavimentar uma estrada que dava acesso a uma fazenda dele em Vitorino Freire, reduto político de sua família. O empreiteiro da obra, um amigo de longa data, havia sido preso meses antes sob a acusação de pagar propina para ganhar as licitações no município maranhense, que é comandado pela irmã de Juscelino. No mês seguinte, foi noticiado que o ministro escondeu da Justiça Eleitoral um patrimônio de mais de 2 milhões de reais em cavalos de raça mantidos na fazenda beneficiada com a estrada custeada pelas tais emendas. Já em março, veio a público que ele havia viajado em um avião da Força Aérea Brasileira (FAB) e recebido diárias do governo para participar de uma agenda privada. Após 100 dias no olho do furacão, Juscelino foi chamado para uma reunião com Lula no Palácio do Planalto. O desgaste era evidente, e a demissão parecia iminente.
Naquele momento, ministros e parlamentares davam de barato que a audiência serviria para selar a saída do ministro, a fim de afastar o governo de um noticiário negativo. Não foi o que ocorreu. A portas fechadas, o clima foi amigável, e Juscelino aproveitou para prestar contas ao presidente e dizer que não havia feito nada de errado. “O senhor viu alguma foto dessa dita estrada? Não viu porque ela não existe”, afirmou, alegando que a obra era um projeto que tinha como objetivo beneficiar toda a comunidade da região onde, coincidentemente, ele tem uma fazenda. Em resposta, o presidente disse que somente o ministro sabia o que de fato aconteceu e até lhe deu uma dose de estímulo: “Vá adiante, encare e enfrente”, aconselhou. Foi o que Juscelino fez. De lá para cá, o ministro teve os bens bloqueados, sua irmã foi afastada temporariamente do comando da prefeitura e surgiram mensagens dele em tratativas com o empreiteiro enrolado. Em junho passado, o cerco judicial se fechou um pouco mais, e Juscelino foi indiciado pela Polícia Federal por corrupção passiva, lavagem de dinheiro, organização criminosa, falsidade ideológica e fraude em licitação. Nada mudou.
Como recomendou o presidente, Juscelino Filho, mesmo indiciado, seguiu adiante, encarando e enfrentando, até que na última terça-feira, 8, foi denunciado pela Procuradoria-Geral da República. Diante da notícia, o governo finalmente entendeu que a situação era insustentável e sacramentou, em meio a informações desencontradas, a saída do primeiro ministro acusado de corrupção nesta gestão de Lula. Enquanto o Planalto informou que o presidente ligou para Juscelino pedindo que ele entregasse o cargo, o ministro escreveu em carta de despedida que, em uma das decisões mais difíceis de sua vida pública, pediu a Lula seu desligamento para “proteger o projeto de país” e em “respeito” ao governo. “A justiça virá!”, registrou o agora ex-ministro.

Há algumas explicações para Lula ter mantido Juscelino no ministério por tanto tempo mesmo diante de um desfecho que parecia inevitável. Uma delas é pessoal. O presidente costuma lembrar do seu próprio calvário e sempre que pode repete ter sido condenado e preso injustamente, para então acrescentar que não fará prejulgamentos. Além disso, predomina o pragmatismo. Para Lula, o desgaste com eventuais constrangimentos morais, se é que de fato existem, é compensado com sobra pela possibilidade de manter e ampliar o apoio de partidos políticos e de bancadas parlamentares. O outrora protegido Juscelino Filho é filiado ao União Brasil, legenda que tem a terceira maior bancada na Câmara, com 59 deputados, além da presidência do Senado, com Davi Alcolumbre. Ele foi indicado ainda durante a transição do governo numa negociação para ampliar a base no Congresso, em tratativa que contou pessoalmente com Alcolumbre e que foi chancelada por Arthur Lira (PP-AL), ex-presidente da Câmara e aliado do ministro demitido.
Com minoria no Parlamento, o governo se encheu de cuidados para não melindrar padrinhos e parceiros tão poderosos. Numa tentativa de conter os danos, o presidente do Senado foi previamente avisado sobre a demissão de Juscelino e recebeu a garantia de que a pasta seguirá sob o comando do partido. Para o lugar, a bancada sugeriu o deputado federal Pedro Lucas, atual líder do União Brasil na Câmara dos Deputados. O cotado a ministro tem algumas semelhanças com o antecessor: é do Maranhão, vem de uma dinastia política de um pequeno município do estado e fez carreira longe dos holofotes. Há, no entanto, uma diferença considerável: Pedro Lucas é aliado do ex-ministro da Justiça e atual ministro do Supremo Flávio Dino e chegou a ocupar um cargo no governo dele no Maranhão. Já a relação entre Dino e Juscelino nunca foi das melhores. O deputado sempre suspeitou que a Polícia Federal agiu contra ele empurrada pelo ex-ministro da Justiça. “Há uma constante artilharia voltada contra o partido”, afirmou um dos principais líderes do União Brasil após a formalização da denúncia contra Juscelino.

O próximo esforço do União será evitar novas baixas. O partido é alvo de um ataque especulativo de outras siglas do Centrão, que tentam pressionar o presidente Lula a dar andamento à prometida reforma ministerial. Com três pastas, o PSD diz estar pouco representado na Esplanada e tenta trocar o inexpressivo Ministério da Pesca pelo Ministério do Turismo, hoje comandado por Celso Sabino. O União resiste a encolher seu espaço no governo. Já o Palácio do Planalto sabe que, faltando um ano e meio para as eleições e dependente do avanço de medidas populares no Congresso para reerguer a popularidade do petista, não seria conveniente desagradar a seus aliados neste momento. A prioridade de Lula, pelo contrário, é adular a base e tentar atrair as legendas de centro para sua eventual candidatura à reeleição. Não será fácil.

O próprio União Brasil está dividido sobre 2026. Uma ala continua no barco governista. Outra caminha em direção contrária — no último dia 4, em evento esvaziado, a legenda formalizou o lançamento da candidatura do governador de Goiás, Ronaldo Caiado, à Presidência. Há ainda um segmento que flerta com uma opção mais moderada de oposição e, como parte do plano para derrotar o petista, tenta fechar ainda neste semestre uma federação com o PP. O objetivo é se consolidar como a maior bancada na Câmara e ganhar espaço como uma das principais agremiações da direita, cacifando-se para fazer parte da chapa que deve enfrentar Lula em 2026. O sonho de Ciro Nogueira, cacique do PP, é emplacar a vaga de vice no possível projeto presidencial do governador paulista, Tarcísio de Freitas. Com problemas de popularidade, Lula age para conter uma debandada. Experiente, ele tem consciência de que a próxima sucessão presidencial tende a ser tão acirrada quanto a de 2022. Por isso, eventuais restrições curriculares, inclusive no campo moral, não são nem serão empecilho para que políticos sejam nomeados ministros. Uma vez chegando lá, o dono da pasta poderá contar com a paciência quase infinita do presidente, como demonstrou o caso de Juscelino Filho.
Publicado em VEJA de 11 de abril de 2025, edição nº 2939
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STF forma maioria para manter prisão de Fernando C…

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25 de abril de 2025
Meire Kusumoto
O Supremo Tribunal Federal (STF) formou maioria na noite desta sexta-feira, 25, para manter a decisão do ministro Alexandre de Moraes que determinou a prisão do ex-presidente Fernando Collor de Mello.
Até o momento acompanharam o relator os ministros Flávio Dino, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Cármen Lúcia e Dias Toffoli. O julgamento ocorre no plenário virtual e deveria se encerrar às 23h59 de hoje, mas foi suspenso mais cedo pelo ministro Gilmar Mendes, que pediu destaque e levou o caso para ser julgado em plenário físico. No entanto, os ministros podem antecipar os seus votos, o que ocorreu.
Faltam os votos dos ministros Luiz Fux, Nunes Marques e André Mendonça, que ainda podem registrá-los no plenário virtual ou esperar o julgamento em plenário físico. O ministro Cristiano Zanin, que atuou na defesa do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na Lava-Jato, se declarou impedido e não participará do julgamento.
Collor foi preso na manhã desta sexta-feira e passou por audiência de custódia horas mais tarde. Ele foi transferido da sede da Polícia Federal em Alagoas para um presídio na capital, Maceió.
Collor foi condenado em 2023 pela Corte a oito anos e dez meses de prisão pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Os ministros ficaram convencidos de que o ex-presidente recebeu 20 milhões de reais de propina entre 2010 e 2014 para usar sua influência política como senador para facilitar obras da UTC Engenharia de construção de bases de distribuição de combustíveis da antiga BR Distribuidora. Segundo a denúncia, a propina foi paga em troca de apoio político para indicação e manutenção de diretores da estatal.
O caso, que foi um dos vários revelados pelas investigações da Operação Lava-Jato, veio à tona com a delação do empreiteiro Ricardo Pessoa, dono da UTC, e foi revelado com exclusividade por reportagens de VEJA em 2015.
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A reiteração do crime contra a democracia na cassa…

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25 de abril de 2025
Matheus Leitão
A demora da Câmara dos Deputados em dar uma resposta às acusações contra o ex-deputado federal Chiquinho Brazão – um dos supostos mandantes do assassinato de Marielle Franco – significou, na verdade, a reiteração do crime: ao mesmo tempo em que resguardou os direitos políticos do ex-parlamentar, poupou seus colegas da incumbência de limpar a Casa com as próprias mãos (isto é, com os próprios votos).
Em vez de submeter Brazão ao julgamento político que se impunha diante da gravidade das denúncias, a Mesa Diretora preferiu destituí-lo por faltas. Não houve tribuna aberta à crítica, nem deliberação em plenário, mas uma manifestação de gabinete, silenciosa e formal, planejada para encerrar o assunto com o menor custo político possível (para todos, menos para a memória e o legado de Marielle, claro, e de Anderson Gomes).
Ao não julgar o mérito do caso, os deputados permitiram que Brazão mantivesse seus direitos políticos. Isso quer dizer que um acusado de mandar matar uma parlamentar poderá candidatar-se novamente. A nossa democracia fingiu que puniu, porém, o que fez foi fragilizar-se.
Mais do que uma brecha regimental explorada com habilidade, a solução revela a escolha deliberada por uma punição esvaziada de sentido: um atalho jurídico que desvia do real problema. E a própria demora no encaminhamento do processo, finalizado no Conselho de Ética, já representava um indicativo claro do destino pretendido.
Sete anos se passaram entre o assassinato de Marielle e a decisão da Mesa Diretora. O parlamento levou 12 meses para colocar um ponto final na história depois da prisão de Brazão, determinada em março do ano passado.
Essa paralisia total, como um silêncio cúmplice, visava uma saída discreta para um caso que necessitava de condenação contudente. Em outras palavras: a história exigia grandeza, a Câmara entregou, como na maioria das vezes, conveniência.
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Matheus Leitão
Enquanto a Lava Jato continua a ser desmontada tijolo por tijolo por excessos judiciais dos mais variados segundo o Supremo, o ex-presidente Fernando Collor de Mello acabou preso justamente em um desdobramento da operação.
O político alagoano que fez a campanha meteórica em 1989 prometendo caçar marajás brasileiros como ele – ganhando a presidência justamente contra Lula – foi condenado pelo STF por corrupção na BR Distribuidora.
Por isso, há uma explicação jurídica muito clara. Collor não foi condenado com base em provas da Odebrecht, por exemplo, anuladas por Dias Toffoli. Não foi condenado em Curitiba, onde Sergio Moro foi considerado parcial, mas em Brasília.
O ex-presidente foi preso porque manteve sua trajetória política e era senador com foro privilegiado. Investigadores da procuradoria-geral da República conseguiram as provas em um braço distante da operação que levou Lula à cadeia e, depois, de volta à presidência.
Em Brasília, os ministros do Supremo entenderam, ainda em 2023, que o ex-presidente recebeu 20 milhões de reais para viabilizar irregularmente contratos da estatal. Bingo! Condenado.
O caso dele envolve a empreiteira UTC e foi revelado em reportagem de VEJA chamada À sombra do delator. O texto conta em detalhes como eram feitos os pagamentos, e como as autoridades chegaram a provas como uma tabela encontrada com o nome do ex-presidente e de seus grupo político.
Collor, aliás, foi denunciado pela PGR em 2015 por esses crimes. Ou seja, foram 10 anos para conclusão do processo. Da condenação em 2023 para cá, inúmeros recursos foram apresentados por seus advogados. Acabaram entendidos pelo onipresente ministro Alexandre de Moraes como “manobras protelatórias”.
Sem mais delongas, o magistrado finalmente mandou prender Fernando Collor. A Polícia Federal fez isso nesta madrugada enquanto o ex-presidente ia para o aeroporto em Alagoas embarcar num voo para Brasília. A prisão foi noturna o que não é nem um pouco usual.
Começou então a votação no plenário virtual para ver se os colegas de toga aprovam a decisão de Moraes. Foi quando o decano Gilmar Mendes, que já havia votado pela absolvição dos réus, suspendeu o processo defendendo que ele seja discutido no plenário físico mesmo.
A maioria dos ministros, contudo, decidiu pela manutenção da prisão, o que deve acontecer provavelmente até a meia-noite.
Da presidência da República ao “Pedro Collor conta tudo” (também em capa de VEJA) o político alagoano com tentáculos nas distribuidoras da Petrobrás viu sua trajetória política terminar em uma cela. Agora, os advogados pedem que ele cumpra a pena em Maceió, berço político e agora também terra do seu provável último capitulo na história do Brasil.
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