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As suspeitas que desafinam os planos de Gusttavo L…

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As suspeitas que desafinam os planos de Gusttavo L...

Ramiro Brites

O cantor sertanejo Gusttavo Lima — 35 anos de idade e 25 de carreira — tem na sua estante dois discos de diamante triplo, cada um deles conquistado depois de superar a impressionante marca de 450 milhões de reproduções nas plataformas de streaming de áudio. No Instagram, ele reúne 45,5 milhões de seguidores, quase o dobro do ex-presidente Jair Bolsonaro, a quem apoiou na eleição de 2022. Astro musical, garoto-propaganda, multimilionário e empresário, ele chamou a atenção na semana passada ao fazer um anúncio inusitado: quer disputar a Presidência da República em 2026. “Estou cansado de ver o povo passar necessidade sem poder fazer muito para ajudar”, disse ao portal Metrópoles. As reações foram da incredulidade aos memes, mas a ideia ganhou tração nos dias seguintes, atraindo interesse de siglas partidárias como PP e União Brasil — e escancarou o labirinto em que se encontra a direita brasileira.

O partido mais próximo de abrigar o astro é o União Brasil. O presidente, Antonio Rueda, encomendou até pesquisa de opinião para testar a receptividade do eleitor. Segundo o governador de Goiás, Ronaldo Caiado, filiado à legenda, amigo do cantor e presidenciável declarado, a agremiação aposta na pluralidade de nomes para ganhar competitividade. “Vamos viabilizar uma chapa que tenha chance de ganhar as eleições”, disse Caiado. Outra possibilidade seria a disputa ao Senado por Goiás, onde o cantor fixou domicílio (ele é mineiro). Essa possibilidade também havia sido aventada pelo presidente do PP, Ciro Nogueira, e até pelo próprio PL, que antes da declaração cogitava filiá-lo para a disputa ao Senado, uma das prioridades do bolsonarismo no próximo pleito.

DIREITA, VOLVER - Com Bolsonaro em 2022: de apoiador a acusado de traição (Pedro Ladeira/Folhapress/.)

Caso consiga viabilizar sua incursão na política, Lima não terá vida fácil. O primeiro obstáculo será contornar os questionamentos sobre as várias confusões que permeiam sua carreira. No ano passado, o cantor chegou a ter a prisão preventiva decretada por envolvimento em suspeitas ligadas a site de apostas. A principal delas é que duas empresas suas, a Balada Eventos e a GSA Empreendimentos, tenham ocultado 49,4 milhões de reais em 2023 e 2024 oriundos das chamadas bets. Deflagrada pela Polícia Civil pernambucana, a Operação Integration também investigou contratos de publicidade dos sites Vai de Bet e Esportes da Sorte com o cantor. Além disso, os donos das duas empresas compraram o mesmo avião de um dos CNPJs do cantor. Primeiro, uma firma de Darwin Henrique da Silva Filho, sócio da Esportes da Sorte, adquiriu a aeronave e devolveu dois meses depois, alegando problemas técnicos. Depois, o mesmo veículo foi comprado por José André da Rocha Neto, dono da Vai de Bet. O pedido de prisão foi feito porque a juíza Andréa Calado da Cruz, da 12ª Vara Criminal de Recife, entendeu que ele ajudou na fuga de Rocha Neto e sua esposa, ambos com pedidos de prisão decretada, cedendo uma aeronave para viagem deles à Grécia. “Nivaldo Batista Lima (nome verdadeiro de Gusttavo Lima), ao dar guarida a foragidos, demonstra uma alarmante falta de consideração pela Justiça. Sua intensa relação financeira com esses indivíduos, que inclui movimentações suspeitas, levanta sérias questões sobre sua própria participação em atividades criminosas”, afirmou a juíza. O cantor obteve um habeas corpus no Tribunal de Justiça de Pernambuco. No fim do ano passado, a Procuradoria-Geral de Justiça do estado pediu o arquivamento do inquérito por falta de provas. Na última quinta, 9, a juíza atendeu ao pedido, mas ressalvou a “possibilidade de reabertura do procedimento caso surjam novas provas”. As suspeitas continuarão sendo investigadas pelo Ministério Público.

BELICISTA - Defensor do armamento civil: “De vez em quando, sapeco uns tiros”
BELICISTA - Defensor do armamento civil: “De vez em quando, sapeco uns tiros” (//Reprodução)
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As suspeitas contra Gusttavo Lima não param por aí. Há mais de dois anos, os contratos do músico com prefeituras de cidades do interior levantam suspeitas de superfaturamento e má administração do recurso público em ao menos sete estados brasileiros. Alguns processos foram encerrados, enquanto outros ainda estão em andamento. A maioria dos shows fica em torno de 1 milhão de reais, às vezes em cidades que têm menos de 10 000 habitantes. Em setembro de 2024, por exemplo, a prefeitura de Petrolândia (PE) contratou por 1,1 milhão de reais um show no mesmo dia em que ele teve a prisão decretada no caso das bets — com a repercussão negativa, foi cancelado. Meses antes, Icó (CE) tentou contratar o cantor com verba destinada à educação, que, por óbvio, não poderia ser remanejada para esse fim. Em outro show que entrou na mira do MP, em Magé (RJ), em 2022, o cantor fez até aceno ao gestor da cidade, Renato Cozzolino (PP). “Alô, prefeito, aquele abraço. Tamo junto”, disse.

Na época em que as autoridades colocaram uma lupa para vasculhar as suspeitas de superfaturamento em shows, Gusttavo Lima desfez um de seus empreendimentos que mostravam não só a diversificação dos negócios — ele é dono de fazendas de gado em Mato Grosso e Minas Gerais e tem patrimônio avaliado em cerca de 1 bilhão de reais —, como também seu alinhamento ideológico. O cantor era sócio do Frigorífico Goiás, que vendia a “picanha do mito”. Os pacotes vinham com uma caricatura de Bolsonaro e custavam 1 800 reais o quilo da picanha de wagyu, o gado com a carne mais cara do mercado.

NEGÓCIO SUSPEITO - Com a aeronave apreendida em operação policial (acima): transação com empresa de apostas levou à investigação por lavagem de dinheiro
NEGÓCIO SUSPEITO – Com a aeronave apreendida em operação policial (acima): transação com empresa de apostas levou à investigação por lavagem de dinheiro (//Reprodução)
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Se virar de fato político, Gusttavo Lima certamente estará inclinado bem à direita. Em 2022, em uma “superlive” patrocinada por Bolsonaro, então candidato à reeleição, Lima elencou os motivos pelos quais apoiava o presidente, como a defesa do armamento civil. “De vez em quando, vou na fazenda e sapeco uns tiros. Tenho um 38, é confusão na certa”, afirmou. Também se disse favorável à liberdade de expressão porque “daqui a pouco não vai poder contar umas piadinhas” e fez crítica ao uso de drogas. Dois anos antes, no entanto, na pandemia, foi alvo de representação ética ao Conar por abuso de bebidas alcoólicas nas lives Buteco em Casa. Bolsonaro, à época, saiu em sua defesa. O apoio mútuo, porém, foi abalado nos últimos dias. O ex-presidente se sentiu traído porque Lima havia dito a ele que tentaria o Senado. Bolsonaristas passaram a espalhar a versão de que seria armação de Lima e Caiado contra o deputado goiano Gustavo Gayer, que pretende se candidatar ao Senado. “Não tem nenhum jogo casado. O Gusttavo Lima tem uma vertente de princípios ideológicos que comungam com o partido”, disse o governador.

A direita brasileira, que vive um clima de barata-voa desde que Bolsonaro foi declarado inelegível, viu sua situação piorar na última semana. Além de Gusttavo Lima, o coach Pablo Marçal, terceiro lugar na disputa pela prefeitura de São Paulo, confirmou que será candidato ao Planalto pelo PRTB, que passará a se chamar Brasileiro. “É um campo que está perdido neste momento porque o principal nome não pode competir”, avalia Yuri Sanches, diretor de análise política da AtlasIntel. Para ele, novos nomes terão de pedir a bênção a Bolsonaro para viabilizar suas pretensões eleitorais. Murilo Hidalgo, diretor do instituto Paraná Pesquisas, diz que o sertanejo precisa passar a se posicionar com frequência sobre os grandes assuntos do país e conceder entrevistas, para ser questionado, já que no palco ele não é confrontado. “O ponto forte é que ele é muito popular. As músicas dele são muito conhecidas de Norte a Sul”, diz. Um problema para Gusttavo Lima é que, diferente do que fez Bolsonaro em 2018 e Marçal em 2024, ele não poderá explorar o discurso antipolítica porque isso soaria contraditório para um profissional que coleciona contratos milionários com prefeituras e tem políticos relevantes em seu grupo de amigos.

FIM DA PIADA - Schwarzenegger: o musculoso virou governador da Califórnia
FIM DA PIADA - Schwarzenegger: o musculoso virou governador da Califórnia (Brooks Kraft LLC/Getty Images)
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O anúncio de que entraria para a política fez o cantor ser alvo de muita desconfiança e algumas brincadeiras. ”Gusttavo Lima por Goiás, que parece até mais para ser candidato a senador. Wesley Safadão pelo Ceará. Vamos convidar Bell Marques para candidato a senador pela Bahia”, disse, rindo, o prefeito de Salvador, Bruno Reis, um dos campeões de votos do União Brasil na eleição de 2024. A história política, no entanto, é recheada de nomes que foram vistos como piada e triunfaram. Ronald Reagan era um ator de segundo escalão antes de entrar para a política, mas foi eleito duas vezes presidente dos Estados Unidos. O musculoso Arnold Schwarzenegger foi eleito e reeleito governador da Califórnia, o estado americano mais populoso e um dos mais influentes. Mas nem todos deram certo. Outro americano, o rap­per Kanye West criou um partido para concorrer à Casa Branca em 2020 e recebeu apenas 60 000 votos de um colégio de 160 milhões.

O eleitorado de direita representa um percentual significativo da sociedade. Pesquisa Ipec feita em 2024 mostra que 35% dos eleitores brasileiros se identificam como de direita, 37% com de centro e 26% de esquerda. Nomes como Gusttavo Lima e Pablo Marçal tendem a ter alguma tração nesse eleitorado, mas falta muito para 2026 e nomes de peso podem entrar na disputa, como os governadores Tarcísio de Freitas (São Paulo) e Ratinho Junior (Paraná), além da incógnita sobre quem será o candidato de Bolsonaro — o ex-presidente, caso não consiga reverter a sua inelegibilidade, pode lançar o filho e deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP).

FIASCO - Kanye West: candidatura independente naufragou em 2020 nos EUA
FIASCO - Kanye West: candidatura independente naufragou em 2020 nos EUA (Lauren Petracca Ipetracca/AP/Imageplus)
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Mesmo com a pulverização momentânea da direita e a descrença de parte do eleitorado no sistema político, o atual cenário está longe de um colapso institucional que favoreceria a vitória de uma figura tão excêntrica. Gusttavo Lima pode, por enquanto, fazer o seu “tchererê tchê tchê”, como diz um pegajoso refrão de hit seu, mas será questionado pelo eleitor e pela sociedade sobre sua visão de mundo, o conhecimento dos problemas do país, as propostas, a capacidade de gestão e articulação política e, claro, pelas muitas suspeitas que foi acumulando — embora, é evidente, tenha todo o direito democrático de se defender, com o benefício da dúvida.

Publicado em VEJA de 10 de janeiro de 2025, edição nº 2926



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Lula dá a Sidônio Palmeira um poder que só um sele…

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Lula dá a Sidônio Palmeira um poder que só um sele...

Daniel Pereira

A Secretaria de Comunicação Social (Secom) não está na lista dos ministérios mais importantes, apesar de seu titular se reunir com frequência com o presidente da República e ter gabinete no Palácio do Planalto. Nos dois primeiros anos do atual governo, a pasta se restringiu basicamente a uma atuação institucional e se transformou num dos alvos preferenciais das reclamações dos governistas, inclusive de Lula.

Ao substituir o deputado Paulo Pimenta (PT-RS) pelo marqueteiro Sidônio Palmeira, o presidente não fez apenas uma tentativa de profissionalizar a comunicação, passando o seu comando para alguém que entende do riscado. Na hierarquia do poder, ele também mudou o status do chefe da Secom, já que Sidônio assume como um ministro de primeira linha, ombreando em prestígio com Rui Costa (Casa Civil) e Fernando Haddad (Fazenda).

Carta branca do chefe

Os sinais de poder de Sidônio ficaram evidentes na primeira reunião ministerial do ano, na qual ele foi a grande estrela e, com o aval de Lula, passou uma série de diretrizes para os colegas de governo. O marqueteiro também já recebeu carta branca para cobrar providências de outros ministros — seja para divulgar ações que possam render popularidade, seja para evitar crises de imagem. Ele já está fazendo isso, por exemplo, na Saúde.

A atuação de Sidônio, que trabalhou nas duas últimas campanhas presidenciais do PT, extrapolará a comunicação. Ele terá assento garantido em reuniões que tratarão de projetos e programas prioritários. Por determinação de Lula, o ministro participou da reunião que definiu os vetos no projeto que regulamentou a reforma tributária.

Antes, mesmo sem ter assumido o cargo, também foi consultado sobre o pacote de corte de gastos anunciado no fim do ano passado. Na ocasião, defendeu a posição, que saiu vitoriosa, de que o governo deveria divulgar — juntos com as tímidas medidas de contenção de despesas — a proposta de ampliação da faixa de isenção do Imposto de Renda para quem ganha até 5 000 reais, iniciativa que repercutiu muito mal no mercado.

Segundo um ministro, o poder dado por Lula a Sidônio tem uma explicação: o presidente só pensa na reeleição e será candidato: “Com o marqueteiro no Planalto, Lula ativou o modo campanha”. Em seu segundo mandato, o petista também nomeou para a Secom um quadro com bastante prestígio político: o jornalista Franklin Martins, que, além das missões específicas no setor, era um dos principais conselheiros políticos do presidente.



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O temor do governo Lula com a ascensão da dupla Tr…

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O temor do governo Lula com a ascensão da dupla Tr...

Laryssa Borges

Donald Trump mal tinha conquistado o voto de 277 delegados eleitorais – sete a mais do que o necessário nas eleições indiretas nos Estados Unidos – no início de novembro quando o governo brasileiro começou a fazer as contas. Com o retorno do republicano à Casa Branca e a ascensão do excêntrico Elon Musk como conselheiro presidencial, auxiliares do presidente Lula concluíram que, a partir de 2025, a dupla usaria todas as ferramentas disponíveis em redes sociais para propagar discursos que, replicados por influencers e parlamentares alinhados ao ex-presidente Jair Bolsonaro, poderiam atingir o governo federal e amplificar ataques e ofensas a ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).

Mesmo barrados em cerimônias que compuseram a posse de Trump na segunda-feira, 20, apoiadores de Bolsonaro – de parlamentares do PL ao deputado Eduardo Bolsonaro – sempre trataram a vitória trumpista como tábua de salvação e ferramenta para que ganhassem fôlego pautas caras a eles, como a aprovação de uma anistia política no Congresso, a divulgação falsa de que o país vive sob o jugo de uma ditadura do Judiciário e a eventual revogação de vistos de entrada de ministros do STF aos Estados Unidos. Ladeado pelos principais representantes das big techs na posse, o presidente americano disse a que veio e, em um de seus primeiros atos, desobrigou plataformas de retirar postagens do ar a pedido do governo.

Dada a imprevisibilidade de Trump, setores do Executivo trabalham com diferentes cenários sobre uma potencial enxurrada de posts que, sob uma pretensa liberdade de expressão ilimitada, ataquem o governo brasileiro e o STF. VEJA colheu de ministros e integrantes do primeiro escalão as seguintes avaliações:

  • a partir de uma postagem de Trump ou de Musk, usuários com alta capilaridade nas redes replicariam, por exemplo, ataques ao ministro do STF Alexandre de Moraes, que no ano passado suspendeu o X no Brasil após a plataforma se recusar a cumprir ordens judiciais.
  • mais do que simples impulsionamento de conteúdo, o governo acredita que o estouro do vídeo do deputado bolsonarista Nikolas Ferreira sobre o monitoramento de movimentações financeiras via pix no Instagram, plataforma de Mark Zuckerberg, pode ter sido o primeiro exemplo de uma suposta interferência das redes na pauta doméstica brasileira.
  • na reunião ministerial do dia 20, o novo ministro da Secretaria de Comunicação Sidônio Palmeira disse que não só o Brasil é alvo potencial do que chamou de “coesão” entre Donald Trump e as big techs e afirmou que acredita que a regulação das redes, hoje sob julgamento no STF, é a principal ferramenta de defesa contra posts que espalhem fake news ou violência.





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Ministro interrompeu férias só para participar da…

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Ministro interrompeu férias só para participar da...

Gustavo Maia

Um dos dois ministros do União Brasil no governo Lula, Juscelino Filho (Comunicações) tinha avisado ao presidente que não poderia ir à reunião ministerial da segunda-feira passada, em Brasília, porque estaria em uma viagem de férias com a família, programada com bastante antecedência.

Ele, aliás, já havia interrompido seu período de descanso no último dia 10 para participar de outra reunião com Lula, sobre a decisão da Meta de acabar com as equipes de moderação de conteúdo.

Em meio à expectativa por trocas no primeiro escalão, o ministro recebeu o recado de até estava com crédito, mas que o chefe fazia questão da presença de todos os 38 auxiliares. Achou melhor deixar a família temporariamente para ir a Brasília, retornando em seguida para curtir o resto das férias, até o fim do mês.





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