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Em meio a denúncias, oposição articula para que Se…

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Em meio a denúncias, oposição articula para que Se...

Ricardo Chapola

Em 2005, o Congresso instalou uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para apurar denúncias de irregularidades nos Correios, depois que um funcionário da estatal foi filmado recebendo propina e explicando como funcionava um esquema de corrupção no governo. Em troca de apoio político, os partidos eram contemplados com cargos importantes na administração federal e usavam esses postos para extorquir empresários e prestadores de serviço. As revelações puxaram o fio de uma meada do maior escândalo de corrupção até então descoberto: deputados e senadores recebiam suborno para votar a favor de projetos de interesse do Palácio do Planalto. Na época, Lula estava no terceiro ano de seu primeiro mandato como presidente da República. O mensalão, como o caso ficou conhecido, provocou uma hecatombe que levou para a cadeia ministros, parlamentares, dirigentes partidários, empresários e banqueiros. Vinte anos depois, a oposição acredita que pode repetir a história.

DEFESA - Santos e Lula: culpa seria do governo anterior (@correiosoficial/Instagram)

No mês passado, o senador Marcio Bittar (União Brasil-AC) protocolou o pedido de instalação de uma nova CPI dos Correios. Em seu requerimento, o parlamentar explicou que o objetivo é investigar supostas irregularidades na gestão da empresa que resultaram em um prejuízo de 3,2 bilhões no ano passado. Entre os problemas listados pelo senador, ao menos por enquanto, não há nada sequer parecido com a gravação que provocou o tsunami no primeiro governo Lula. Bittar, porém, aposta que grandes descobertas vão emergir a partir da auditagem que será feita nas contas da estatal, comandada desde o início do governo pelo advogado Fabiano Silva dos Santos. Ele chegou ao cargo por indicação do Prerrogativas, grupo de advogados ligado aos petistas, promoveu uma série de mudanças na administração, mas os balanços não têm apresentado números muito animadores. A última vez que a estatal fechou suas contas no azul foi em 2021, ainda no governo de Jair Bolsonaro, quando registrou lucro de 3,7 bilhões de reais. Depois disso, a situação se inverteu.

Os Correios têm 85 000 funcionários, 10 472 de agências ativas e faturaram cerca de 20,1 bilhões em 2024. Para os senadores de oposição, a gestão de Santos é responsável pelos maus resultados da empresa, seja por decisões equivocadas, seja por iniciativas suspeitas. Marcio Bittar destaca que só uma CPI pode esclarecer os motivos que levaram a estatal, por exemplo, a desistir de litigar em uma ação trabalhista na qual foi obrigada a pagar 614 milhões de reais. Outra decisão questionada diz respeito a um acordo através do qual os Correios assumiram uma dívida de 7,6 bilhões de reais do Postalis, o fundo de pensão dos funcionários. O acordo, suspeitam os parlamentares, teria gerado honorários milionários ao escritório de advocacia que atuou na causa, o mesmo que, no passado, tinha o presidente dos Correios como um dos sócios. Santos nega ter cometido qualquer ilegalidade. “Minha saída do escritório foi oficializada em novembro de 2022, muito antes de eu assumir a presidência da empresa”, justifica. A ex-mulher dele e o irmão, no entanto, ainda integram a banca (leia a entrevista).

PRIORIDADE - Bolsonaro e Bittar: patrimônio dilapidado
PRIORIDADE - Bolsonaro e Bittar: patrimônio dilapidado (@MarcioBittarOficial/Facebook)

A determinação para colocar os Correios no radar da oposição foi de Jair Bolsonaro, que tentou, durante seu governo, privatizar a empresa. O ex-presidente tem compartilhado com seus aliados denúncias que tem recebido sobre a estatal. “O Congresso não pode ficar assistindo a um patrimônio nacional ser dilapidado outra vez e não fazer nada. Espero que a presidência do Senado cumpra com seu dever e crie a comissão”, diz Bittar. A instalação da CPI depende de uma decisão do presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP). Os bolsonaristas reconhecem que convencer o senador não será tarefa fácil, já que ele tem evitado se indispor com o presidente Lula. Para pressioná-lo, Bittar foi orientado por Bolsonaro a negociar apoio político. “Depois de 2026, existe uma chance muito grande de a direita formar maioria absoluta no Senado. Davi precisa criar uma relação de confiança com os conservadores, caso contrário, não vai conseguir a reeleição em 2027”, argumenta Bittar.

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A ORIGEM - Corrupção: em 2005, funcionário foi filmado recebendo propina
A ORIGEM - Corrupção: em 2005, funcionário foi filmado recebendo propina (./Reprodução)

Pelo regimento do Senado, podem funcionar simultaneamente até cinco CPIs. Hoje, há apenas duas comissões em andamento — uma que apura a manipulação em apostas esportivas e outra que investiga a influência das chamadas bets no orçamento das famílias. Caso haja resistência por parte da presidência do Congresso, ainda existe a possibilidade de ingressar com um recurso no Supremo Tribunal Federal — o que, se vier a acontecer, vai criar uma situação curiosa. Em 2021, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), então presidente do Congresso, se negava a instalar a CPI da Covid, uma iniciativa da bancada de oposição que mirava o governo Bolsonaro. Na época, o senador Alessandro Vieira (MDB-SE) impetrou uma ação no STF invocando o direito da minoria. O ministro Luís Roberto Barroso acolheu o pedido. “Trata-se de garantia que decorre da cláusula do estado democrático de direito e que viabiliza às minorias parlamentares o exercício da oposição democrática. Tanto é assim que o quórum é de um terço dos membros da casa legislativa, e não de maioria. Por esse motivo, a sua efetividade não pode estar condicionada à vontade parlamentar predominante”, sustentou o magistrado. Os bolsonaristas, que eram contra a CPI, espernearam e classificaram a decisão como uma interferência indevida sobre as prerrogativas do Legislativo.

A CPI que investigou corrupção na estatal há duas décadas já começou como um escândalo, por pouco não arrastou para o abismo o então presidente Lula e produziu um enorme estrago na imagem do governo e do PT. Esse histórico anima a oposição, que tem uma estratégia bem definida para tentar emplacar a nova comissão. A primeira é recolocar em pauta o debate sobre a privatização da empresa — processo interrompido pelo atual governo por razões ideológicas. A segunda, que está ligada à primeira, é produzir o máximo de desgaste político ao Palácio do Planalto. Matéria-prima não vai faltar. O fundo de pensão dos funcionários, por exemplo, sempre foi um manancial de escândalos nunca devidamente esclarecidos.

ESCÂNDALO - CPI: investigação desvendou o caso que ficou conhecido como mensalão
ESCÂNDALO - CPI: investigação desvendou o caso que ficou conhecido como mensalão (Lula Marques/Folhapress/.)
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Na lista elaborada pelos senadores sobre os fatos que merecem investigação aprofundada, há um item que, embora pareça menos relevante, revela muito sobre a empresa e seus gestores. No fim do ano passado, quando os Correios já admitiam a situação de insolvência, a direção autorizou o pagamento de uma gratificação de 2 500 reais a todos os servidores. O presentinho, batizado jocosamente de “vale-peru”, custou a bagatela de 200 milhões de reais. Não precisa dizer quem, no final, vai acabar pagando essa e outras contas.

“Narrativas distorcidas”

Presidente da ECT, o advogado Fabiano Silva dos Santos falou a VEJA sobre o movimento da oposição no Senado para instaurar uma nova CPI

A oposição fala em irregularidades financeiras como justificativa para a instalação da CPI dos Correios. Como o senhor vê esse movimento? Não há qualquer irregularidade nas contas da empresa. Em 2024, atingimos 81,98% de maturidade na gestão de riscos, um avanço de 11% em relação a 2022. Isso mostra quanto temos nos dedicado a aprimorar a governança e fortalecer os controles internos.

Qual sua versão sobre o suposto elo entre o senhor e o escritório de advocacia que conduziu o acordo da dívida com a Postalis? Essa informação não tem qualquer fundamento. O escritório do qual fui sócio não presta serviços ao Postalis desde 2017 e a confissão de dívida dos Correios ocorreu somente em 2023. O próprio Postalis já informou que não houve contratação de qualquer assessoria jurídica. Além disso, minha saída do escritório foi oficializada em novembro de 2022, muito antes de eu assumir a presidência da empresa.

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Como justificar um prejuízo de mais 3 bilhões? Os desafios financeiros são resultado de uma falta de investimentos no passado. Entre 2019 e 2021, a média anual de investimentos foi de apenas 345 milhões de reais, um valor muito abaixo do necessário. Desde 2023, retomamos os investimentos, elevando essa média para 750 milhões de reais ao ano. Já investimos mais de 2 bilhões de reais. Isso já está trazendo resultados concretos, como a recuperação de contratos estratégicos e a retomada da confiança do mercado.

Isso é suficiente? A reestruturação de uma empresa do tamanho dos Correios leva tempo. O sucateamento do passado nos prejudicou muito, mas já iniciamos uma recuperação sólida, com o apoio do governo. Estamos diversificando nossas atividades, investindo na logística da saúde, ampliando a distribuição de medicamentos e insumos e nos preparando para lançar um banco digital, que vai facilitar transações financeiras e promover inclusão bancária. Além disso, ainda neste semestre, vamos lançar nosso marketplace, criando novas oportunidades para empreendedoras e empreendedores de todo o país. Estamos também implementando um conjunto de medidas para equilibrar as contas.

O que é exatamente esse sucateamento do passado? A falta de investimentos, o desmonte do quadro técnico e decisões equivocadas comprometeram a nossa capacidade operacional. Além disso, a tentativa de privatização gerou incerteza no mercado.

Em pleno século XXI, não é anacrônico o Estado precisar controlar uma empresa como os Correios? Somos a única empresa presente em todos os municípios. Prestamos um serviço essencial, especialmente em regiões onde o setor privado não tem interesse em atuar. Uma pessoa que vive nas regiões mais distantes tem o direito de vender e receber seus produtos. A atividade dos micro e pequenos negócios é essencial para o desenvolvimento do país e só uma empresa pública forte é capaz de gerar essa integração.

Publicado em VEJA de 21 de março de 2025, edição nº 2936



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Frase do dia: Alexandre de Moraes

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Frase do dia: Alexandre de Moraes

Matheus Leitão

Frase do dia: Alexandre de Moraes | VEJA

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“Em face de sua condição de ex-presidente da República, observo que o cumprimento da pena na ala especial do referido presídio deverá ser em cela individual” (Alexandre de Moraes, ministro do Supremo Tribunal Federal, ao determinar a prisão do ex-presidente Collor de Mello em tratamento especial)


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Lula abraça o tom de campanha eleitoral, mas pesqu…

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Lula abraça o tom de campanha eleitoral, mas pesqu...

Heitor Mazzoco

Durante a campanha de 2022, em meio a uma disputa apertada contra Jair Bolsonaro, o hoje presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse a cinco dias do segundo turno: “Eu, se eleito, serei um presidente de um mandato só. Os líderes se fazem trabalhando, no seu compromisso com a população”, afirmou. Logo depois de vencer, no entanto, pouca gente duvidava que ele mudaria de ideia e iria, sim, tentar um novo mandato. Isso só foi posto em dúvida no final de 2024, quando, além da aprovação em queda, sofreu um grave acidente doméstico (cortou a cabeça ao cair no banheiro). Dali, passou a condicionar uma nova candidatura ao cenário político e a suas condições de saúde (ele completará 81 anos em 2026) — o que criou muita aflição, especialmente no PT, que passou a discutir nos bastidores quem poderia substituir o seu líder histórico. Nas últimas semanas, no entanto, as dúvidas parecem ter se dissipado. Lula tem empilhado eventos, em Brasília e pelo país, em que discursa como candidato: lista o que fez, diz que ainda fará o que foi prometido e não foi feito e lança novas promessas para um horizonte que vai muito além do fim do seu mandato.

A mudança de tom vem se desenhando aos poucos, mas sempre na mesma direção: mostrar que é candidato à reeleição. Em fevereiro, durante encontro com prefeitos em Brasília, martelou o que considera sua maior qualidade, que seria atender todo mundo, inclusive adversários, e mandou o recado. “Quando terminar o meu mandato, vocês vão dizer: “Lulinha, Lulinha, fica, porque nós precisamos de um presidente que goste de nós”, disse. Em 3 de abril, capitaneou o evento “O Brasil dando a volta por cima”, pensado pelo ministro-chefe da Secom, Sidônio Palmeira, para embalar o que o governo fez em dois anos e insistir na pregação de que a primeira metade da gestão foi para superar a terra arrasada deixada por Bolsonaro. Um dia depois, em reunião com senadores da base (incluindo siglas como PSD, MDB e União Brasil), houve um bate-papo reservado que tinha só uma finalidade: esboçar estratégias para a campanha à reeleição do petista.

Paralelamente a isso, Lula foi para as ruas servir de mascate de seu governo. Um exemplo claro da apresentação de promessas para além de 2026 se deu há pouco mais de uma semana, em evento de ampliação da produção da fábrica da Nissan, em Resende (RJ), no último dia 15. “Nós tomamos uma decisão de que até 2030 todas as crianças brasileiras estarão alfabetizadas até o segundo ano”, afirmou — 2030, vale lembrar, seria o último ano de um eventual quarto mandato. Um dia antes, ao inaugurar um campus da Universidade Federal Fluminense, em Campos dos Goytacazes (RJ), também discursou em tom de campanha. Criticou a elite, que “só imaginava que a gente fosse cortador de cana” e disse que “precisou um torneiro mecânico, sem diploma universitário, governar este país para ser o presidente que mais fez universidades na história”. “Analise quantas escolas foram feitas no mandato que terminou outro dia”, disse, já cutucando Bolsonaro.

O ritual é muito parecido nos eventos, para onde sempre leva integrantes do primeiro escalão para apoiar a sua explanação sobre os feitos do governo. O ministro Fernando Haddad (Fazenda), por exemplo, falou nos últimos encontros sobre a proposta de empréstimo consignado para trabalhadores no regime CLT. “Procure trocar a sua dívida cara por uma barata. É saber fazer bom uso desses instrumentos que o governo federal está criando para ajudar o trabalhador”, disse no anúncio de investimentos do Mercado Livre, em São Paulo, em 7 de abril. Outros ministros espalham boas-novas, como a ampliação da faixa de renda do Minha Casa, Minha Vida e a isenção de Imposto de Renda para quem ganha até 5 000 reais por mês, dois trunfos com os quais o governo conta para ganhar o coração da classe média. Sem contar a estratégia de martelar o tempo todo a paternidade de iniciativas populares, como Bolsa ­Família, Mais Médicos e Samu.

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POR FORA - Tarcísio: sem anunciar candidatura ao Planalto, já é ameaça a Lula
POR FORA - Tarcísio: sem anunciar candidatura ao Planalto, já é ameaça a Lula (Pablo Jacob/Governo do Estado de SP/.)

A preocupação eleitoral também pode ser notada pelo roteiro de viagens. Só entre fevereiro e abril, foram quatro idas a Minas Gerais, o segundo maior colégio eleitoral do país, onde Lula ganhou de Bolsonaro em 2022 por 0,4 ponto percentual e onde a direita é franca favorita a vencer em 2026. Em abril, também esteve em São Paulo, Rio de Janeiro, Ceará e Pará — todos estados entre os dez maiores colégios eleitorais do país. A oposição já percebe o movimento eleitoral do petista. “O povo vê com clareza: ele age como candidato, não como presidente. Usa dinheiro público para tentar se manter no poder em 2026, mas não engana mais ninguém”, diz o deputado federal Rodrigo Valadares (União Brasil-SE), para quem cada viagem de Lula é uma tentativa frustrada de esconder a rejeição crescente do eleitor. “Enquanto o Brasil enfrenta problemas reais, Lula está mais preocupado em fazer autopromoção”, afirma o vice-líder da oposição na Câmara, Ubiratan Sanderson (PL-RS).

Indiferente a essas críticas, o petista tem ao menos duas motivações, além, claro, de melhorar a imagem do governo. Uma é apagar eventuais inseguranças no seu campo político. Internamente, os líderes de partidos de esquerda não trabalham com outra opção que não seja a de Lula subir no palanque para a sétima disputa presidencial de sua carreira. Mesmo no PT, no qual várias correntes se digladiam para ver quem assume o comando do partido em julho, há uma unanimidade: o candidato é Lula. “Vamos construir um partido forte, combativo e capaz, inclusive, de reeleger o presidente Lula em 2026, que é nossa grande meta”, diz o deputado Rui Falcão, que desafia exatamente o candidato de Lula, o ex-prefeito Edinho Silva. Outro que foi instado pelo presidente a voltar de vez para o cenário político é o ex-ministro José Dirceu, escalado para ajudar a eleger Edinho, disputar uma vaga na Câmara e articular a formação de uma frente, para além da esquerda, que possa enfrentar a direita.

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EM FAMÍLIA - Michelle e o inelegível Bolsonaro: bons números em pesquisa
EM FAMÍLIA - Michelle e o inelegível Bolsonaro: bons números em pesquisa (@jairmessiasbolsonaro/Instagram)

O trabalho, no entanto, não será fácil. Levantamento sobre a sucessão presidencial divulgado pelo instituto Paraná Pesquisas nesta semana mostra que Lula terá de suar para conseguir um quarto mandato (veja o quadro). No segundo turno, ele aparece atrás de todos os adversários sondados: Bolsonaro (que está inelegível e tenta reverter a situação), a ex-­primeira-dama Michelle Bolsonaro e, o mais provável, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos). Para piorar, o petista tem a maior rejeição: 51,9% não votariam nele de jeito nenhum, enquanto apenas 24,5% dizem que o escolheriam com certeza se seu nome aparecesse de novo na urna. E, por fim, a desaprovação ao seu governo chegou a 57,4%, o maior número da série histórica do instituto iniciada em agosto de 2023.

Lula, é claro, confia em reverter a tempo o quadro e disfarça cada vez menos que deseja ir para mais uma disputa. O anúncio oficial já tem até data. Será em julho, logo depois da eleição interna do PT. Até lá, o presidente vai tentar mudar os humores de grande parte dos eleitores. “Mas não adianta citar o PIB e outros dados macroeconômicos se as pessoas não têm a percepção de que o país melhorou”, afirma Eduardo Lima, mestre em história social pela Unesp. Com o preço dos alimentos em alta (dois em cada três dos brasileiros mais pobres passaram a comprar menos comida, segundo o Datafolha), por exemplo, Lula vai ter de gastar muita saliva e sola de sapato daqui para a frente.

Publicado em VEJA de 25 de abril de 2025, edição nº 2941



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Tribunais de contas se consolidam como abrigo para…

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Tribunais de contas se consolidam como abrigo para...

Hugo César Marques

Os tribunais de contas são órgãos auxiliares do Legislativo criados para fiscalizar o bom uso do dinheiro dos contribuintes. É uma tarefa das mais importantes. Se executada com diligência, funcionaria como uma blindagem às obras inúteis, ao desperdício, aos malfeitos e à corrupção. Os conselheiros contam com estabilidade no cargo, têm mordomias variadas e ainda se aposentam com vencimentos integrais. Há casos em que os vencimentos superam os 100 000 reais por mês. Indicados pelos governantes de plantão, os TCs, porém, costumam ser dóceis com quem tem poder, e são raras as decisões do colegiado que se revertem efetivamente em algo a favor dos cofres públicos. Essa leniência tem muito a ver com a própria composição dos tribunais, que desde sempre serviram de abrigo para amigos de políticos e políticos em fim de carreira, o que já é, por si só, um tremendo paradoxo.

Para agravar a situação, nos últimos anos, as Cortes passaram também a hospedar parentes e mulheres de políticos, alguns sem qualificação para ocupar o cargo. A polêmica mais recente a respeito dessa prática vem da Paraíba. Se nenhuma reviravolta acontecer, em breve a bacharel em direito Alanna Vieira, de 38 anos, será a mais nova conselheira do Tribunal de Contas do Estado. Estudante de medicina, ela é filha do deputado estadual Adriano Galdino (Republicanos), presidente da Assembleia Legislativa.

INFLUÊNCIA – Alanna Vieira e Adriano Galdino: pai é presidente da Assembleia Legislativa do estado (./Reprodução)

Como é praxe em casos assim, o Ministério Público tentou impedir a posse, argumentando que nomear parente, além de imoral, caracterizava “nepotismo indireto”, já que, formalmente, a indicação foi feita pelo governador João Azevêdo (PSB), aliado do deputado. Seguindo o protocolo, o pai argumentou que o fato de a candidata ser sua filha é irrelevante. O que importava é que ela atendia aos requisitos da lei e era preparada para a função. O caso foi parar na Justiça, um magistrado suspendeu o processo, mas a decisão foi revogada dias depois. Tudo resolvido, se não fosse um detalhe: uma auditoria do tribunal descobriu que Alanna Vieira foi, durante anos, funcionária fantasma do governo.

Em outras palavras, a provável futura conselheira encarregada de fiscalizar o bom uso do dinheiro público dos paraibanos recebia sem trabalhar. É impressionante. A estudante de medicina, segundo os auditores, ocupou o cargo de agente de programas governamentais da Secretaria de Planejamento por mais de uma década. Nesse período, ela recebeu o equivalente a 646 000 reais em salários. “Não há qualquer registro documental que possa comprovar a prestação de serviços por parte da ex-servidora. Mas, ao contrário, as evidências demonstram que a Sra. Alanna Camilla Santos Galdino Vieira sequer tinha cadastro como usuária dos sistemas informatizados utilizados pela secretaria”, diz o relatório. “Nenhum servidor entrevistado, nestes incluídos chefes imediatos, a conheceu ou tem conhecimento de trabalhos por ela realizados para a referida secretaria”, concluíram os técnicos. O Ministério Público quer que ela devolva o dinheiro recebido indevidamente. A defesa de Alanna nega irregularidades e diz que foram anexados documentos que comprovam a frequência no cargo.

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arte tribunal de contas

A prática da nomeação de parentes para os tribunais de contas parece não ruborizar mais ninguém e, talvez por isso, tem se alastrado país afora. No governo Lula, por exemplo, há nada menos que cinco ministros, todos ex-governadores de seus respectivos estados, cujas esposas foram alçadas a conselheiras desses órgãos. Entre elas, há uma enfermeira, uma empresária e uma psicopedagoga (veja o quadro). O cargo garante uma certa tranquilidade financeira aos seus ocupantes. Um levantamento feito pelo jornal O Globo mostra que os membros dos TCEs receberam em média 69 700 reais de salário neste ano, 50% a mais do que recebe um ministro do Supremo Tribunal Federal, o teto do funcionalismo público federal. “É preciso criminalizar este tipo de nepotismo que hoje prospera numa zona cinzenta da legislação, por falta de uma regra clara”, diz o procurador de Justiça Roberto Livianu, presidente do Instituto Não Aceito Corrupção.

Há também indiscutíveis interesses que permeiam essas indicações. “O aparelhamento dos tribunais por cônjuges e parentes de autoridades mina a confiança da sociedade nesses órgãos e aumenta os riscos de seu uso político para blindar aliados, perseguir adversários e favorecer negócios privados”, adverte Renato Morgado, da Transparência Internacional. Santos de casa às vezes fazem milagres.

Publicado em VEJA de 25 de abril de 2025, edição nº 2941



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