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Flip exalta vidas gaúchas e palestinas em debate – 11/10/2024 – Ilustrada

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Walter Porto

Qual o sentido de escrever se você está morrendo? A pergunta do escritor palestino Atef Abu Saif enunciou o que pairava pelas cabeças em Paraty na noite desta sexta.

Em uma das mesas de tom mais grave da programação, a Flip resolveu aproximar a guerra conflagrada na Faixa de Gaza das enchentes que devastaram o Rio Grande do Sul —situações muito diferentes, como admitiu desde o começo a mediação da advogada Bianca Tavolari. Por que então montar um debate assim?


“As duas experiências se aproximam pela perda de referências, do plano mais íntimo da casa até o espaço urbano, quando o lugar onde você mora não existe mais e não existirá da mesma forma”, apontou Tavolari. Ela apresentava dois escritores sensíveis que trabalharam nesse contexto de máxima tensão.

O palestino Saif, nascido em um campo de refugiados em Gaza, lançou no Brasil o livro “Quero Estar Acordado Quando Morrer”, narrando os 85 dias que permaneceu na sua região natal após os ataques do Hamas em 7 de outubro de 2023 e os bombardeios de Israel, que deixaram dezenas de milhares de palestinos mortos e agora se estendem ao Líbano.

Julia Dantas, nascida em Porto Alegre e autora do recente “A Mulher de Dois Esqueletos”, organizou o blog “Diário da Enchente”, com testemunhos de dezenas de gaúchos sobre a maior tragédia climática no Sul, em maio. “Os diários se impõem em momentos de urgência porque não há o tempo da literatura, de escrever e elaborar, as coisas precisavam ser ditas naquele instante”, afirmou.

“Não tenho grandes talentos para lidar com enchentes, mas todos estávamos muito mobilizados. As pessoas que tinham barcos fizeram resgate e transporte de alimentos, e a escrita era o meu barco possível.”


Saif afirmou que nunca quis escrever diários. “Mas o que um escritor faz é escrever. Depois de uma semana de ver tudo sumir, ser destruído, eu senti que realmente podia morrer até o fim do dia. E pensei, caso eu morra, quero que pessoas saibam o que aconteceu comigo.”

Isso fez com que outras pessoas o abordassem para contar as histórias delas também, cimentando a impressão de que a escrita é fundamental para se sentir vivo, para não ser esquecido.

“42 mil palestinos foram mortos, mas eu não sou 42 mil. Sou uma pessoa, e cada pessoa tem centenas de sonhos. Eu não queria ser um número.”

Saif hoje mora na Europa e, quando perguntam a ele como é a vida em Gaza, responde que é como viver no noticiário. “Como uma prisão. Cerca de 85% das pessoas que moram em Gaza nunca saíram de lá. E agora estão demolindo essa prisão com os prisioneiros junto.”

A mesa da Flip foi tomada por depoimentos mais íntimos que geopolíticos —se é que dá para fazer essa distinção—, mas ao final deu uma guinada diante das perguntas da plateia.

Dantas afirmou que a reeleição do atual prefeito de Porto Alegre, Sebastião Melo —que segundo ela se encaminha para acontecer depois de 49,7% dos votos válidos no candidato do MDB no primeiro turno— faz parte do mesmo terreno do inacreditável da experiência das enchentes.

“Mas houve mais abstenções do que votos nele, o que soa como um desânimo geral, uma descrença em um projeto para o futuro.”

Saif argumentou que Israel é um país criado por uma resolução da ONU e, mesmo assim, não cumpre nenhuma resolução da ONU —o que revela uma faceta desalentadora da comunidade internacional.

“Os direitos humanos existem para poucos, não para todo mundo”, disse ele. “Mas temos que acreditar em um mundo em que a injustiça não exista mais. Talvez eu não esteja vivo para ver, mas vai acontecer.”

Antes, o mesmo palco reuniu o piauiense Odorico Leal, que estreou nos contos com a incensada coletânea “Nostalgias Canibais”, e a pernambucana Micheliny Verunschk, veterana que venceu o Jabuti com o romance “O Som do Rugido da Onça”, para um debate sobre a capacidade da literatura de organizar ou ressignificar a realidade.

Mais que uma conversa, a mesa mediada por Rita Palmeira foi uma oportunidade para dois autores que dialogam com a ideia de antropofagia apresentarem seus livros e temas ao público.

“Tenho visto muitos escritores falando como literatura tem se deparado com uma realidade contraditória, tão paródica que fica difícil manejar literariamente”, disse Leal, emendando num comentário sobre as candidaturas derrotadas de Pablo Marçal e Tabata Amaral em São Paulo.

“Acabamos de sair de uma eleição em que um candidato menciona o suicídio do pai de outra candidata. Só falar disso num debate político é quase inapreensível. E ao mesmo tempo tem, na Paulista, evangélicos chorando porque esse candidato não foi ao segundo turno. Não consigo imaginar contradição maior.”

“E a literatura tem que trabalhar com o verossímil, as pessoas buscam ali consonâncias que apontem para alguma coisa inteligível”, apontou, arrematando com um comentário espirituoso —só acha a literatura a melhor forma de lidar com isso porque seu trabalho é ser escritor.

Verunschk disse que ver pessoas ostentarem a defesa da tríade “família, tradição e propriedade” faz pensar “que tempo é esse e em que mundo eu estou?”

“O real está cada vez mais movediço, craquelado, e você como artista tem que reorganizar sua mirada para poder responder a essas questões. Não sei se a literatura tem todos os elementos para responder, mas pode fabular em cima disso e criar novos problemas. E isso é bom.”



Leia Mais: Folha

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Ufac inicia 34º Seminário de Iniciação Científica no campus-sede — Universidade Federal do Acre

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Ufac inicia 34º Seminário de Iniciação Científica no campus-sede — Universidade Federal do Acre

A Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação (Propeg) da Ufac iniciou, nessa segunda-feira, 22, no Teatro Universitário, campus-sede, o 34º Seminário de Iniciação Científica, com o tema “Pesquisa Científica e Inovação na Promoção da Sustentabilidade Socioambiental da Amazônia”. O evento continua até quarta-feira, 24, reunindo acadêmicos, pesquisadores e a comunidade externa.

“Estamos muito felizes em anunciar o aumento de 130 bolsas de pesquisa. É importante destacar que esse avanço não vem da renda do orçamento da universidade, mas sim de emendas parlamentares”, disse a reitora Guida Aquino. “Os trabalhos apresentados pelos nossos acadêmicos estão magníficos e refletem o potencial científico da Ufac.”

A pró-reitora de Pesquisa e Pós-Graduação, Margarida Lima de Carvalho, ressaltou a importância da iniciação científica na formação acadêmica. “Quando o aluno participa da pesquisa desde a graduação, ele terá mais facilidade em chegar ao mestrado, ao doutorado e em compreender os processos que levam ao desenvolvimento de uma região.”

O pró-reitor de Extensão e Cultura, Carlos Paula de Moraes, comentou a integração entre ensino, pesquisa, extensão e o compromisso da universidade com a sociedade. “A universidade faz ensino e pesquisa de qualidade e não é de graça; ela custa muito, custa os impostos daqueles que talvez nunca entrem dentro de uma universidade. Por isso, o nosso compromisso é devolver a essa sociedade nossa contribuição.”

Os participantes assistiram à palestra do professor Leandro Dênis Battirola, que abordou o tema “Ciência e Tecnologia na Amazônia: O Papel Estratégico da Iniciação Científica”, e logo após participaram de uma oficina técnica com o professor Danilo Scramin Alves, proporcionando aos acadêmicos um momento de aprendizado prático e aprofundamento nas discussões propostas pelo evento.

(Camila Barbosa, estagiária Ascom/Ufac)

 



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Representantes da UNE apresentam agenda à reitora da Ufac — Universidade Federal do Acre

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Representantes da UNE apresentam agenda à reitora da Ufac — Universidade Federal do Acre

A reitora da Ufac, Guida Aquino, recebeu, nessa segunda-feira, 22, no gabinete da Reitoria, integrantes da União Nacional dos Estudantes (UNE). Representando a liderança da entidade, esteve presente Letícia Holanda, responsável pelas relações institucionais. O encontro teve como foco a apresentação da agenda da UNE, que reúne propostas para o Congresso Nacional com a meta de ampliar os recursos destinados à educação na Lei Orçamentária Anual de 2026.

Entre as prioridades estão a recomposição orçamentária, o fortalecimento de políticas de permanência estudantil e o incentivo a novos investimentos. A iniciativa também busca articular essas demandas a pautas nacionais, como a efetivação do Plano Nacional de Educação, a destinação de 10% do PIB para a área e o uso de royalties do petróleo em medidas de justiça social.

“Estamos vivenciando um momento árduo, que pede coragem e compatibilidade. Viemos mostrar o que a UNE propõe para este novo ciclo, com foco em avançar cada vez mais nas políticas de permanência e assistência estudantil”, disse Letícia Holanda. Ela também destacou a importância da regulamentação da Política Nacional de Assistência Estudantil, entre outras medidas, que, segundo a dirigente, precisam sair do papel e se traduzir em melhorias concretas no cotidiano das universidades.

Para o vice-presidente da UNE-AC, Rubisclei Júnior, a prioridade local é garantir a recomposição orçamentária das universidades. “Aqui no Acre, a universidade hoje só sobrevive graças às emendas. Isso é uma realidade”, afirmou, defendendo que o Ministério da Educação e o governo federal retomem o financiamento direto para assegurar mais bolsas e melhor infraestrutura.

Também participaram da reunião a pró-reitora de Graduação, Ednaceli Damasceno; o pró-reitor de Assuntos Estudantis, Isaac Dayan Bastos da Silva; a pró-reitora de Pesquisa e Pós-Graduação, Margarina Lima de Carvalho; o pró-reitor de Extensão e Cultura, Carlos Paula de Moraes; representantes dos centros acadêmicos: Adsson Fernando da Silva Sousa (CA de Geografia); Raissa Brasil Tojal (CA de História); e Thais Gabriela Lebre de Souza (CA de Letras/Português).

 

(Camila Barbosa, estagiária Ascom/Ufac)

 



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Multa para ciclistas? Entenda o que diz a lei e o que vale na prática

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Multa para ciclistas? Entenda o que diz a lei e o que vale na prática

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Tomaz Silva / Agência Brasil

Pode não parecer, mas as infrações previstas no Código de Trânsito Brasileiro não se limitam só aos motoristas de carros e motos — na verdade, as normas incluem também a conduta dos ciclistas. Mesmo assim, a aplicação das penalidades ainda gera dúvidas.

Nem todos sabem, mas o Código de Trânsito Brasileiro (CBT) descreve situações específicas em que ciclistas podem ser autuados, como pedalar em locais proibidos — o artigo 255 do CTB, por exemplo, diz que conduzir bicicleta em passeios sem permissão ou de forma agressiva configura infração média, com multa de R$ 130,16 e possibilidade de remoção da bicicleta.

Já o artigo 244 amplia as situações de infração para “ciclos”, nome dado à categoria que inclui bicicletas. Entre os exemplos estão transportar crianças sem segurança adequada, circular em vias de trânsito rápido e carregar passageiros fora do assento correto. Em casos mais graves, como manobras arriscadas ou malabarismos, a penalidade prevista é multa de R$ 293,47.

De fato, o CTB prevê punições para estas condutas, mas o mais curioso é que a aplicação dessas regras não está em vigor. Isso porque a Resolução 706/17, que estabelecia os procedimentos de autuação de ciclistas e pedestres, foi revogada pela norma 772/19.

Em outras palavras, estas infrações existem e, mesmo que um ciclista cometa alguma delas, não há hoje um mecanismo legal que permita a cobrança da multa.




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